Título: Lula fez uma jogada audaciosa
Autor: Berzoini, Ricardo
Fonte: O Globo, 23/08/2009, O País, p. 4

Para cientista político, PT está refém das ambições políticas do presidente

ENTREVISTA

O plano de poder do presidente Lula pôs o PT à mercê das conveniências eleitorais do governo , com vistas à eleição de 2010, analisa o cientista político Amaury de Souza, formado pela Massachusetts Institute of Technology.

Para ele, o cenário desenhado por Lula, sem consultar o PT, levou o partido a viver uma das maiores crises da sua história.

Flávio Freire SÃO PAULO

O GLOBO: Essa crise do PT era uma situação previsível? AMAURY DE SOUZA: O problema básico não surgiu com o PT, mas com o Executivo, mais precisamente com o presidente Lula, que fez uma jogada audaciosa ao lançar a candidatura da Dilma Rousseff sem nenhum pedigree eleitoral. Com isso, correu dois grandes riscos, de começar uma campanha eleitoral dois anos antes e o de pagar qualquer preço para ter o PMDB na chapa da Dilma. E a razão é simples, já que, com o PMDB, Dilma conseguirá nove minutos e meio no horário eleitoral, enquanto José Serra ou Aécio Neves ficam com seis.

O senhor acredita que, obtido este casamento com o PMDB, ele irá além da eleição? SOUZA: A peça final dessa estratégia do Lula era confinar a eleição de 2010 a apenas dois resultados: Dilma com Serra ou Aécio. De tal sorte que o Lula poderia colocar o ingrediente final, também arriscado, de transformar a eleição presidencial em plebiscito do próprio governo Lula. E assim ele seria de fato o candidato, como se fosse o alter ego de Dilma.

O presidente pôs sua aspiração política acima da do PT? SOUZA: Sim. A primeira providência que ele tomou foi eliminar terceiros candidatos que fossem potencialmente competitivos.

Obviamente, estamos falando de Ciro Gomes. Lula negociou com o PSB e com o próprio Ciro para que ele viesse a disputar o governo de São Paulo, para viabilizar a estratégia de uma eleição plebiscitária. Com isso, ficaria um candidato tucano, Dilma e, quem sabe, Heloisa Helena.

Teríamos então o padrão de eleição polarizada.

Essa ascendência de Lula sobre o partido explicaria o recuo do senador Mercadante em deixar a liderança da bancada? SOUZA: Um líder de bancada que se porta dessa maneira, vai e volta, é porque está num conflito interno terrível. O fato concreto é que ele foi desautorizado, seja qual for a interpretação psicológica ou política.

Mercadante disse para a bancada fazer uma coisa e, depois, o presidente disse para falar para a bancada fazer o contrário. É surreal.

Até que ponto a saída de Marina Silva balança ainda mais as estruturas do PT? SOUZA: Ao sair do PT, Marina deu um pretexto para todos os partidos e candidatos que se opunham à estratégia de Lula para também lançar suas candidaturas.

Uma eventual candidatura de Marina precipita a candidatura de Ciro, que agora vai esquecer São Paulo para disputar a Presidência. Isso esfacela a estratégia de Lula