Título: Mercado funciona
Autor:
Fonte: O Globo, 24/08/2009, Opinião, p. 6

TEMA EM DISCUSSÃO: Jornada de trabalho

A recente crise econômica mundial - que por pouco não empurrou o planeta para uma depressão tão terrível como a de 1929-1934 - mostrou, na prática, a importância de se ter flexibilidade nos contratos de trabalho. Até mesmo em países com regras rígidas (França e Alemanha, por exemplo), sindicatos perceberam a gravidade do momento e aceitaram negociar reduções temporárias de jornada de trabalho com respectiva diminuição de salários e benefícios, em contrapartida à manutenção de empregos.

No Brasil ocorreu algo semelhante. A indústria demitiu, mas, em alguns setores (mineração, siderurgia, bens de consumo duráveis), o quadro teria sido pior não fosse a possibilidade de se recorrer a férias coletivas, licenças parcialmente remuneradas, banco de horas etc.

Dessa forma, o impacto da crise sobre o mercado de trabalho, especialmente no Brasil, não chegou a ter a dimensão trágica que a crise certamente causaria em outra situação, de mais rigidez nas regras contratuais. E isso sem dúvida contribuiu para abreviar o período recessivo.

Diante de tal experiência, a insistência em se discutir uma redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais (sem alteração de salários) parece esdrúxula. A economia mundial passará necessariamente por um processo de ajuste nos próximos anos, durante o qual se sairão melhor os países que conseguirem permanecer competitivos.

Mudar a jornada de trabalho - uma das bases das regras contratuais - em meio a uma conjuntura ainda nebulosa representa enorme risco para os trabalhadores. Tudo indica que o Brasil retomará a trajetória de aumento dos empregos formais, com carteira assinada. O mercado, nesse caso, caminhará a favor dos trabalhadores e, refletindo a realidade da economia do país, se ajustará naturalmente, trazendo ganhos talvez maiores do que os ilusoriamente proporcionados por uma redução de jornada de trabalho imposta por decisão do Congresso.