Título: Senado agora debate fim do Conselho de Ética
Autor: Vasconcelos, Adriana; Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 25/08/2009, O País, p. 8

Após crise com bancada, Mercadante passa a cobrar de colegas petistas informação prévia sobre seus discursos

BRASÍLIA. Enquanto PSDB e DEM discutem a possibilidade de seus integrantes no Conselho de Ética do Senado apresentarem uma renúncia coletiva, como reação ao arquivamento sumário das 11 representações contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), o senador Tião Viana (PT-AC) defende a extinção do colegiado. A proposta também foi defendida semana passada pelo próprio Sarney.

Caberia ao Supremo Tribunal Federal a missão de julgar os parlamentares, inclusive sobre questões éticas.

A expectativa de Viana era aprovar amanhã na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) seu projeto de resolução propondo a extinção do Conselho.

O relator da proposta, Antonio Carlos Magalhães Júnior (DEMBA), antecipou que é contra: ¿ Sou contra a extinção do Conselho, mas estou propenso a sugerir uma audiência pública para fazer alguns ajustes no seu funcionamento.

Senador do DEM chama proposta de ¿burrice¿ O presidente da CCJ, Demóstenes Torres (DEM-GO), considera uma ¿burrice¿ a extinção do Conselho de Ética: ¿ Isso não passa, e seria burrice, porque a perda de mandato por quebra de decoro parlamentar independe da existência ou não do Conselho. Se ele for extinto, as representações passarão a ser analisadas diretamente pelo plenário do Senado.

O presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), voltou a defender a renúncia coletiva dos integrantes da oposição no Conselho: ¿ Esse Conselho é hoje o símbolo de tudo que não deveria haver no Senado.

Já Sarney, aliviado com a decisão do Conselho, imaginou que os dias de constrangimento eram página virada. Foi à tribuna munido de histórias e poemas para homenagear os 100 anos de morte do escritor Euclides da Cunha e falar sobre o suicídio do ex-presidente Getulio Vargas, há 55 anos. Acabou surpreendido por um inflamado Eduardo Suplicy (PT-SP): ¿ Senador José Sarney, a situação do Senado não está tranquila, não está resolvida. As pessoas desejam o esclarecimento mais cabal, desejam que as dúvidas sobre o conteúdo das representações sejam efetivamente dirimidas.

Sarney começou a tremer os lábios mostrando nervosismo e irritação. Suplicy contou que tem sido pressionado nas ruas.

E repetiu sugestão recebida, em São Paulo, do professor Claude Machline, de 87 anos, ao terminar uma aula na Escola de Administração da Fundação Getulio Vargas (FGV): ¿ ¿Eduardo, você precisa ir ao Senado e dizer `J´accuse¿¿ (eu acuso, em francês). E essa é a voz que ouço de toda parte, nas centenas de e-mails que tenho recebido.

Sarney acusa Suplicy de ferir ¿regras da educação¿ Sarney ficou contrariado: ¿ Vossa Excelência feriu uma regra, o que acho que não é do seu estilo... a memória de Euclides da Cunha. A não ser que esteja tomado por tamanha paixão política, que deixe de respeitar as regras mais comezinhas da educação e da convivência parlamentar.

Sarney, depois, tentou alfinetálo, com ironia: ¿ Não entendo como o professor Suplicy não conheça esse livro tão célebre de Émile Zola, que trata da defesa de uma grande injustiça! Mas, na ânsia de tentar constranger o petista, Sarney errou: ¿J¿accuse¿ não é um livro, mas um manifesto publicado em forma de carta pelo escritor Émile Zola na capa do jornal ¿L¿Aurore¿, de 13 de janeiro de 1898, ao presidente da República Félix Faure, contra a condenação de Alfred Dreyfus. Capitão do exército francês e de origem judaica, Dreyfus foi injustamente acusado de traição.

Suplicy pretendia fazer um discurso com cobranças a Sarney ontem, mas mudou de ideia depois de receber uma ligação em plenário. Ele admitiu que o líder do PT, senador Aloizio Mercadante (SP), lhe pediu para submeter parte de seu pronunciamento à bancada, em reunião marcada para hoje, antes de proferi-lo.