Título: Um último convite ao pré-sal
Autor: Barbosa, Flávia; Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 27/08/2009, Economia, p. 21

Planalto avalia que governadores perderão com boicote a evento oficial

BRASÍLIA

O governo considera equivocada a posição dos estados do Rio, do Espírito Santo e de São Paulo de tratar a União como inimiga no novo marco regulatório do pré-sal. Segundo o Palácio do Planalto, os governadores ¿ respectivamente, Sérgio Cabral, Paulo Hartung e José Serra ¿ enfrentarão uma batalha muito mais dura no Congresso Nacional, onde as bancadas das demais 24 unidades da federação estão ávidas para avançar na gorda parte da riqueza do petróleo que fica hoje com os dois grandes estados produtores do Brasil ¿ Rio e Espírito Santo ¿ e que caberá a São Paulo ¿ que, com o présal, entrará para o seleto grupo.

Ainda assim, o governo sabe que o desgaste será grande se os três principais estados envolvidos na discussão boicotarem o megaevento da próxima segunda-feira, porque as ausências impedirão o discurso de concertação nacional que vem sendo cuidadosamente lapidado. Por isso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai fazer o gesto político de convidar Cabral, Hartung ¿ estes ele mesmo, por telefone ¿ e Serra.

Se eles recusarem o convite, Lula vai lavar as mãos. A avaliação do Palácio do Planalto é que, se os governadores recusarem o convite, vão ficar isolados e enfraquecidos nesse debate, ¿porque o placar é 24 a 3¿, segundo um assessor do presidente.

Ministro prevê mudança de posição

Mas, com a forte reação política até mesmo dos aliados, cresce a chance de o presidente Lula tratar da divisão da distribuição de riquezas só após a apresentação ao Congresso dos três projetos que abordam os aspectos técnicos do marco regulatório. Lula avalia anunciar na próxima segundafeira que um quarto texto, sobre a distribuição das compensações financeiras, será alinhavado com os demais entes da federação.

O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, minimizou a reação política de Cabral e Hartung ¿ que, como revelaram os colunistas Ancelmo Gois e Ilimar Franco na edição de ontem do GLOBO, afirmaram que não vão ao evento de lançamento do pré-sal. Múcio aposta que eles e Serra estarão presentes: ¿ É claro que essa posição é reversível. Essa reação é natural da política. Agora, o petróleo é brasileiro, e os outros estados também precisam participar.

O ideal, avaliam interlocutores da comissão interministerial que elaborou o marco regulatório, seria que os peemedebistas Cabral e Hartung e o tucano Serra buscassem um acordo com o governo para atuar como aliados nas batalhas em plenário, pois a sede dos demais estados é imensa.

Pelo último levantamento do governo, há mais de 30 projetos de lei bem estruturados no Congresso que propõem mudanças nas fórmulas que definem quais estados têm direito a determinados campos e à distribuição dos royalties. Sete deles foram apresentados de julho para cá. A maioria é prejudicial, especialmente ao Rio.

¿ Muito do pré-sal já está licitado, sob concessão, e vai render muito mais dinheiro, por 30 anos, do que os campos até agora já renderam, sobretudo para o Rio. Para estes três estados, deixar a coisa na mão do Congresso, tratando o governo como inimigo, pode resultar em prejuízo ¿ disse outro integrante da comissão.

No Planalto, a reação desses governadores foi vista como compreensível politicamente. Um interlocutor direto do presidente Lula chegou a comentar que Cabral precisa fazer o discurso político mais contundente em defesa dos recursos para o Estado do Rio ¿ caso contrário, será criticado por adversários como o exgovernador Anthony Garotinho (PR).

Porém, Lula e seus assessores alertam que a discussão do pré-sal não é um problema de governo contra oposição ou um debate ideológico. Mas, sim, uma divisão dos recursos que serão gerados pelo pré-sal. Por isso, o presidente aposta que em algum momento Cabral, Hartung e Serra vão negociar. Do contrário, a fatura para eles pode ser muito elevada.

¿ O melhor será eles admitirem que todo mundo tem que ganhar com o pré-sal ¿ disse uma fonte.

Além disso, defende a União, Rio, Espírito Santo e São Paulo vão ganhar muito dinheiro com os 29% de área do pré-sal conhecido já licitados sob o regime de concessão. O Plano Decenal de Expansão de Energia 2008-2017 prevê que só os campos de Tupi e Carioca ¿ ambos no cluster da Bacia de Santos, com início de produção comercial estimado para 2012 ¿ pagarão em 2017 aos estados R$ 3,8 bilhões e aos municípios, R$ 2,1 bilhões. O Estado do Rio e seus municípios ficarão com 45% desses recursos.

A estimativa é que em 2017 todos os campos do pós-sal (o que existe hoje, mais algumas novas áreas licitadas sob concessão) destinarão R$ 30 bilhões a todos os entes federados (municípios, estados e União), enquanto só os dois campos do pré-sal responderiam por R$ 17,9 bilhões.