Título: Planalto enfrenta dilema na divisão da riqueza
Autor: Gois, Chico de; Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 28/08/2009, Economia, p. 23

Pressionado pelos estados, Lula quer evitar desgaste político da decisão sobre os recursos do petróleo

BRASÍLIA. A três dias do megaevento de lançamento do marco regulatório do pré-sal, a cúpula do governo permanece envolvida na matemática política da divisão das riquezas com a exploração do petróleo em águas ultraprofundas. Isso significa que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva continua indeciso sobre se a União vai propor uma forma de distribuição dos recursos auferidos com a atividade ou deixará o assunto integralmente nas mãos do Congresso.

O tema tem sido exaustivamente debatido pela comissão interministerial, mas a fórmula final vem sendo sistematicamente postergada. Isso porque o governo sabe que a mesma lógica que usa para desmobilizar Rio, Espírito Santo e São Paulo ¿ a de que os três estados enfrentam não a União, mas as demais 24 unidades da federação ¿, também serve de pressão sobre o Palácio do Planalto.

Se Lula ceder aos estados produtores ¿ propondo a manutenção da fórmula atual de divisão ou endossando a proposta do Rio de reservar uma parte generosa aos estados produtores ¿ enfrentará a fúria das outras 24 unidades da federação (entre elas os estados do Nordeste e o Paraná), promovendo ¿uma carnificina no Congresso¿, disse um interlocutor de Lula.

Se propuser um novo mecanismo, mais igualitário entre os estados brasileiros, terá um trio poderoso como opositor, desagradando ao PMDB (partidos de Sérgio Cabral e Paulo Hartung e aliado privilegiado nas eleições de 2010) e o maior colégio do país, São Paulo. Desse ponto de vista, a melhor alternativa seria a ¿terceira via¿: propor que o Congresso decida ou que se construa conjuntamente (lideranças políticas, entes e sociedade civil) um quarto projeto.

Governo teme definição de fórmula ruim no Congresso Mas aí entra um risco técnico, que terá repercussão política no futuro: sair uma fórmula bizarra que não atende a ninguém, deixa em risco a destinação do dinheiro do pré-sal e que ainda deixe a União na seca.

¿ A matemática política está na ponta do lápis ¿ afirma uma fonte.

Hoje, a União e os entes da federação têm direito a duas compensações pela exploração do petróleo: royalties (determinação constitucional) e Participação Especial (a PE, definida por decreto). A alíquota dos royalties é de 10%, sobre a produção bruta dos campos, dos quais 70% ficam com 11 estados e 996 municípios.

No caso da PE, segundo o volume extraído, há uma taxa de até 40% sobre a produção líquida.

Do dinheiro levantado, metade é entregue à União, 40% ficam com seis estados e 10% são repassados a 37 municípios.

Por determinação da Lei do Petróleo, de 1997, estados confrontantes (produtores e limítrofes) já ficam com a parte mais representativa da arrecadação.

No caso dos royalties, dos R$ 10,94 bilhões distribuídos em 2008, o Estado do Rio ficou com 69% da parcela estadual e o Espírito Santo, com 8%. Os municípios fluminenses levaram 67% e os capixabas, 7%. Já em relação aos R$ 11,71 bilhões pagos em PE, tanto o governo estadual quanto os municipais receberam 95%, no caso do Rio, e 3%, no do Espírito Santo.

Juridicamente, a decisão sobre a divisão do bolo do pré-sal tem até a votação final da lei para ser decidida. Por isso, continuava forte ontem à noite a tendência de Lula não fazer uma proposta da União de imediato.

Perguntado se o marco regulatório já está fechado, o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, afirmou: ¿ Essa questão do royalty não está fechada. É o Congresso que vai dizer verdadeiramente como vai ficar.