Título: Mais longe da meta fiscal
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 28/08/2009, Economia, p. 21

Superávit primário cai 71,2%, para R$ 3,18 bilhões, no pior julho desde 2001

BRASÍLIA

Aqueda na arrecadação, o aumento dos gastos públicos e as desonerações fiscais feitas pelo governo para enfrentar a crise levaram o país a fechar julho com o pior superávit primário (receitas menos despesas, sem contar o pagamento de juros da dívida pública) da História para o mês. O resultado foi 71,2% menor do que a economia para pagamento de juros obtida no mesmo mês do ano passado. O desempenho das contas públicas praticamente sepultou as chances de cumprimento da meta fiscal deste ano, de superávit primário de 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país).

Se isso ocorrer, será a primeira vez, em uma série iniciada em 1998, que o setor público não entregará a meta fiscal acordada. Segundo o Banco Central (BC), o esforço fiscal de governo central, estados, municípios e empresas estatais somou R$ 3,18 bilhões no mês passado, o menor resultado para o período desde o início da série, em 2001. No ano, o superávit primário está acumulado em R$ 38,435 bilhões, o que equivale a 1,76% do PIB, num fluxo de 12 meses.

Para analista, será difícil cumprir meta

Em junho, essa relação estava em 2,04% do PIB, e vem caindo desde o início do ano. A meta oficial é de 2,5% e pode, no máximo, cair a 2%.

¿ Esses resultados são ruins, mas não surpreendem por causa das medidas tomadas para combater a crise. Mas está parecendo que não vai ter como o setor público cumprir a meta neste ano, mesmo usando o PPI (Projeto Piloto de Investimento) ¿ afirmou o economista-chefe do banco Schahim, Sílvio Campos Neto.

O economista se refere à lista de investimentos federais que podem ser retirados dos gastos públicos para efeito de cumprimento da meta fiscal.

O resultado das contas públicas em julho foi influenciado fortemente pelos governos regionais (estados e municípios), com superávit primário de R$ 797 milhões, o menor dos últimos seis anos para esse período. Em julho do ano passado, os governos regionais tiveram superávit primário de R$ 1,691 bilhão. O resultado piorou, segundo o chefe do departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, porque não houve repasses importantes da União no mês.

Dívida pública sobe para R$ 1,28 trilhão

Para ele, os resultados gerais são ainda coerentes com o atual nível de atividade econômica. Ele acredita que haverá recuperação do quadro fiscal a curto prazo.

¿ Trabalhamos com o cumprimento da meta, que este ano é de 2,5% (do PIB) ¿ defendeu Lopes.

Os números do governo central (governo federal, INSS e Banco Central) também pesaram na conta do mês passado, com resultado primário positivo de apenas R$ 1,691 bilhão, também o pior da série histórica. As empresas estatais, já excluindo a Petrobras, registraram superávit primário de R$ 692 milhões.

O Banco Central informou também que o pagamento de juros da dívida pública ¿ objetivo do superávit primário ¿ em julho somou R$ 16,196 bilhões. Como economizouse apenas R$ 3,180 bilhões, as contas públicas registraram um déficit nominal de R$ 12,989 bilhões no período.

No ano, o déficit nominal está acumulado em R$ 56,671 bilhões, R$ 40 bilhões a mais do que em igual período de 2008, o que equivale a 3,35% do PIB num fluxo de 12 meses. Para cobrir este rombo, o país se endivida.

Não por menos, a dívida líquida total do setor público chegou a R$ 1,283 trilhão em julho, o que equivale a 44,1% do PIB, acima dos 43,2% do mês anterior. Para agosto, acrescentou Lopes, a expectativa é que o endividamento público fique estável.

Para especialistas, o crescimento da dívida pública não chega a tirar o sono, já que neste momento de crise é natural que os gastos do governo cresçam. Quando comparada com outros países, a relação entre dívida pública e PIB do Brasil pode ser considerada até pequena.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a dívida pública já representa próximo de 70% do PIB.

Apesar disso, a avaliação é que, a médio prazo, os gastos do governo podem começar a trazer reflexos negativos. Os analistas criticam, principalmente, a qualidade das despesas.

¿ O governo brasileiro continua não dando sinais de que vai reduzir, ou parar de elevar, os gastos correntes (com funcionalismo, por exemplo) ¿ afirmou José Luciano Costa, economista sênior da Itaú Unibanco Asset Management.

No mês passado, o aumento de 0,8 ponto percentual na relação entre dívida pública e PIB veio do déficit nominal do período e do impacto do câmbio, cada um contribuindo com 0,4 ponto percentual.

Desde então, o dólar continuou perdendo força frente ao real, afetando positivamente a dívida pública, já que o Brasil é credor externo.