Título: Nos municípios, futuro em xeque
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 30/08/2009, Economia, p. 28

Arrecadação cai, projetos param e foco se volta ao pré-sal

Enviado especial

CAMPOS, QUISSAMÃ, RIO DAS OSTRAS e RIO. Já afetados pela queda de até 60% na arrecadação de royalties este ano, por causa do recuo no preço do petróleo, municípios fluminenses temem perdas maiores com as novas regras de exploração no pré-sal, que o governo federal anuncia amanhã. Para prefeitos e especialistas, os investimentos dos últimos anos podem ficar comprometidos. Em muitas cidades, obras de infraestrutura foram paralisadas, e projetos sociais estão sendo reavaliados.

Especialistas afirmam que Quissamã, a 234 quilômetros do Rio, é um exemplo de uso consciente dos royalties. Com o dinheiro do petróleo ¿ R$ 220 milhões no ano passado ¿, o saneamento básico e a internet banda larga chegaram a quase toda a área urbana. A educação ganhou estímulo. Os jovens, por exemplo, têm a faculdade paga pela prefeitura.

¿ A educação sempre foi o principal foco ¿ diz o prefeito Armando Carneiro, do PSC.

Os moradores, porém, dizem que faltam oportunidades. Daiana Marcelia do Patrocínio, que cursa Psicologia, faz um ¿bico¿ de vendedora em uma farmácia.

¿ A única coisa ruim aqui é emprego. Eles pagam faculdade para a gente, mas do que adianta, se não tem oportunidade? ¿ indaga Daiana, que tem duas irmãs desempregadas.

O destaque da cidade é o programa Casa Popular, que representa 20% das moradias.

Mas, com a queda na arrecadação do petróleo ¿ que será de R$ 150 milhões este ano ¿, haverá ajustes nos programas.

¿ Por isso, a regulamentação do pré-sal é importante para o estado ¿ diz o prefeito.

Campos, que arrecadou R$ 1,189 bilhão com o petróleo ano passado, tem uma favela centenária bem na entrada da cidade. Segundo José Luiz Vianna da Cruz, cientista social da Universidade Federal Fluminense (UFF), ao comparar os R$ 6 bilhões recebidos nos últimos dez anos com o petróleo e o avanço dos investimentos, pouca coisa foi feita. Mesmo assim, o déficit de saneamento, saúde e educação foi reduzido.

¿ Sem esse dinheiro, o avanço não teria acontecido. Mas não se reverteu no aumento da renda e na geração de emprego.

A dona de casa Claudia Marci diz que ¿não há nada de bom¿ em Campos. O jeito é trabalhar com reciclagem e não cair doente: ¿ Os postos de saúde fecharam.

Um dos poucos bons exemplos lembrados é a construção de conjuntos habitacionais. No Chatuba, que abriga 400 famílias, os desempregados Marli Pereira e Carlos Roberto são vizinhos.

¿ Esqueceram da gente. Quando chove, os banheiros ficam alagados ¿ reclama Marli.

A prefeita de Campos, Rosinha Garotinho (PMDB), que assumiu a cidade este ano, também não poupa críticas. Segundo ela, a rede de escolas e hospitais está sucateada, bem como o sistema de saneamento. A arrecadação de royalties, de R$ 546 milhões até agosto, recuou 32% em relação ao ano anterior.

¿ O desafio agora é o pré-sal, pois Campos perde tudo com o modelo em discussão.

Preocupação semelhante tem o prefeito de Rio das Ostras, Carlos Augusto Balthazar, do PMDB. Para ele, o novo modelo pode pôr em xeque as conquistas desses municípios.

¿ É sempre um desafio investir em rede de saneamento e água. Decidimos mudar o investimento dos royalties. Antes, fazíamos ações como o porcelanato no calçadão da praia, mas agora estamos voltados para saúde e educação.

Já contamos com 18 postos de saúde, um hospital e 40 unidades de ensino.

No Bairro Âncora, o aposentado Petronilho Apolinaro reclama das redes de água e esgoto.

¿ Vamos investir mais em saneamento. Será preciso quebrar o porcelanato, para instalar tubulações. Algumas obras tiveram de ser paradas. Por isso, o pré-sal é importante. É desleal mudar a lei ¿ diz o prefeito de Rio das Ostras, onde a arrecadação de royalties caiu de R$ 347 milhões, em 2008, para R$ 211 milhões.

Em Macaé, favelização e saneamento preocupam.

Rômulo Campos, da Câmara de Gestão, diz que a cidade é invadida por trabalhadores em busca de oportunidades no petróleo.

COLABOROU Erica Ribeiro