Título: Ator ajudou a disfarçar sequestradores
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 30/08/2009, O País, p. 3

BRASÍLIA. A fuga dos sequestradores do embaixador americano Charles Burke Elbrick contou com o apoio discreto de um conhecido artista de TV: o ator Carlos Vereza, da Rede Globo.

Antigo simpatizante da esquerda, Vereza virou dublê de cabeleireiro e maquiador para ajudar a disfarçar alguns integrantes da ação armada durante a caçada iniciada após a libertação do diplomata. Os participantes do sequestro acabaram presos. A revelação está no livro ¿Dossiê Gabeira¿, lançado esta semana pelo jornalista Geneton Moraes Neto.

Depois de 40 anos, Vereza deu o primeiro depoimento sobre o assunto, descrevendo cenas engraçadas da missão secreta. Ele relata que foi levado até os esconderijos dos guerrilheiros no banco traseiro de um Karmann-Ghia, de olhos vendados e sentado sobre um poderoso arsenal da luta armada.

¿Eu estava com uma mala cheia de produtos de maquiagem: bigodes, produtos para descolorir cabelo. Minha tática foi a seguinte: quem era louro tinha de virar moreno. E viceversa.

Eu não podia ser redundante na maquiagem. Cortei o cabelo de todo mundo num estilo parecido com o de uma banda punk. Antecipei o corte¿, brincou o ator.

No livro de Moraes Neto, Vereza fez piada com a punição imposta até hoje contra os participantes do sequestro: a proibição de pisar em território americano: ¿Não sei se depois dessa entrevista eu, que não conheço os Estados Unidos, vou conseguir o visto¿, disse o ator.

Sem mencionar o nome de Vereza, o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) narrou o caso no livro ¿O que é isso, companheiro¿, escrito no exílio na Suécia e publicado em 1979: ¿O artista me cortou o cabelo e o pintou de louro.

Os irmãozinhos punk que moram perto do meu prédio, se vivessem no Brasil na época, iam gostar tanto do corte irregular quanto do escândalo da cor. (...) Para os padrões estéticos mais clássicos que vigoravam na época, estava horrorosa a nova figura que compunha¿.

O disfarce de Fernando Gabeira não chegou a ser posto à prova, porque ele ainda passaria meses escondido num apartamento na Rua Jangadeiros, em Ipanema. Além do deputado, o ministro Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, também contou ao GLOBO ter sido disfarçado por Vereza. Com simpatia, ele se referiu ao ator como velho militante do Partido Comunista Brasileiro.