Título: Minha possível candidatura contribuirá com a agenda socioambiental
Autor: Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 05/09/2009, O País, p. 10

Embora ainda resista em assumir oficialmente sua candidatura à Presidência da República, a senadora Marina Silva, recentemente filiada ao PV, será a estrela principal do próximo programa de propaganda eleitoral de seu novo partido. Ela já comemora os primeiros efeitos de sua possível entrada nessa disputa. Como a inclusão da temática ambiental nos últimos pronunciamentos da ministra Dilma Rousseff, a possível candidata do PT, com quem travou embates no período que esteve à frente do Ministério do Meio Ambiente.

Adriana Vasconcelos

O GLOBO: A senhora concorda com a expulsão de pessoas nesse processo de reestruturação do PV? MARINA SILVA: O PV tem um déficit de organização. Essa reestruturação é que vai eleger novos quadros para dirigir o partido. Ela pressupõe novos filiados e candidatos que tenham densidade programática.

Não é a Marina que está chegando e fazendo isso.

A senhora deixou o PT no dia em que o partido ajudou a salvar José Sarney de possível cassação. Incomoda o fato de o filho dele ser do PV? MARINA: O fato de ser filho do presidente Sarney não significa que tenha de se responsabilizar por algo. Se eu cometer um erro, não quero que meus filhos sejam tratados com preconceito. Minha posicão em relação ao deputado Zequinha Sarney tem a ver com a trajetória dele no Ministério do Meio Ambiente. Dei continuidade a muitas políticas que encontrei. Ele goza do respeito da comunidade ambientalista.

Como será enfrentar seu antigo partido numa disputa presidencial? MARINA: Espero que, depois dessa crise, as pessoas se disponham muito mais ao debate de ideias e projetos do que ao embate. Não vejo a política como a lei do mais forte, mas como um pacto de convencimento, que não se dá a qualquer preço. É fundamental que nós nos atenhamos mais à autoridade dos argumentos que ao argumento das autoridades.

A ministra Dilma introduziu o tema ambiental em seus pronunciamentos. É reflexo de sua possível candidatura? MARINA: Se os prováveis candidatos assumirem cada vez mais a questão ambiental, é uma coisa positiva. Porque este tema estava tão distante do debate... As pessoas tinham até medo de falar nele, de criar suscetibilidades com setores muito refratários ao meio ambiente. Esse contato com a realidade faz bem para todos, porque as pessoas sabem a realidade dos grupos de interesse, nos quais o meio ambiente é sempre visto como um entrave.

Foram com a ministra Dilma seus principais embates no governo? MARINA: As pessoas falam dos embates, mas também tivemos encontros. Quando Dilma foi ministra de Minas e Energia e ficou à frente da elaboração da lei do sistema elétrico, grande parte das sugestões que levamos foi acolhida. Já como ministra da Casa Civil, ela coordenava os Ministérios dos Transportes, de Minas e Energia e da Agricultura, refratários a qualquer agenda de sustentabilidade.

Que nota a senhora daria para o governo Lula na área ambiental? MARINA: Quando você quer apenas detectar o problema, você dá uma nota. Mas, quando queremos ajudar a resolver o problema, fazemos uma avaliação. Então, prefiro ficar com a avaliação. Conseguimos avanços importantes na economia, com distribuição de renda. Do ponto de vista da agenda da atualidade, ficou muito a desejar.

Dados sobre o desmatamento já indicam que ele possa voltar a crescer.

A senhora, em algum momento, se decepcionou com o presidente Lula? MARINA: Não poderia dizer que é apenas uma questão de falta de sensibilidade. O presidente tem uma sensibilidade muito grande para questões sociais. Talvez seja falta de compreensão da maioria dos partidos e líderes políticos em relação ao tema.

No último ano e meio, houve retrocesso na legislação ambiental, tanto no Congresso como em setores do governo.

A senhora acha que sua candidatura tira mais votos de qual candidato? MARINA: Não se tira voto de ninguém, o voto é do eleitor. Essa visão patrimonialista de que os votos são de Dilma ou Serra é uma visão equivocada da política. Prefiro acreditar que minha possível candidatura possa contribuir com a democracia, com o avanço da agenda socioambiental