Título: Subjugação
Autor:
Fonte: O Globo, 08/09/2009, Opinião, p. 6

Quanto mais intensa a luta político-partidária, maior poder ela tem de embaralhar debates, reduzir ou eliminar o foco em questões que de fato importam.

Sepultada a crise em torno do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) ¿ e da pior maneira possível ¿, algumas conclusões sobre esta convulsão política se cristalizam.

Uma delas é que os interesses político-eleitorais do Planalto converteram um caso de evidências de quebra de decoro ¿ sério, por envolver o presidente da Casa ¿ em uma crise de proporções desmesuradas.

Ao considerar a defesa intransigente e cega da permanência de Sarney à frente da Mesa do Senado imprescindível ao apoio formal ¿ o apoio real é outra história ¿ do PMDB à candidatura Dilma Rousseff, o presidente Lula se tornou vulnerável à acusação de patrocinar uma indevida interferência do Executivo no Legislativo.

Seria ingenuidade imaginar que uma turbulência em torno do presidente do Senado, ou da Câmara, não interesse ao Planalto, nem leve o Governo a executar ações políticas para defender proveitos postos em risco no Congresso.

Mas o que aconteceu na crise Sarney teve outra dimensão: até a bancada do PT, partido de Lula, foi atropelada pela realpolitik do presidente.

Como a imagem do PT de um partido ético, cultivada nos tempos de oposição, já havia sido trincada de maneira profunda no escândalo do mensalão, parte da bancada considerou suicida a defesa de Sarney, cuja posição ficou bastante vulnerabilizada com a revelação de casos de nepotismo no Senado, parte do escândalo dos atos secretos.

A resistência do senador Aloizio Mercadante (PT-SP) esfarelou-se na revogação de uma demissão ¿irrevogável¿ da liderança da bancada.

E ocorreu o desfecho desejado pelo Planalto: o engavetamento, sem qualquer investigação, de representações, uma ou outra bem fundamentada, contra Sarney.

Entre as várias conclusões de análises da crise ¿ abalo no coronelismo político, por exemplo ¿, destaca-se a que, ao praticar mais uma vez a máxima de que os fins justificam os meios, o PT se curvou, talvez definitivamente, à força do presidente. O lulismo superou e subjugou o petismo.