Título: A transferência de tecnologia não é só com o Brasil
Autor:
Fonte: O Globo, 14/09/2009, O País, p. 4

Hélène Masson, especialista em indústria da Defesa na Fundação para Pesquisa Estratégica, em Paris, compara a barganha nos próximos meses para vencer o bilionário contrato do Brasil para compra de caças a um jogo de xadrez. Os rivais da França, as indústrias dos Estados Unidos e da Suécia, não desistiram da batalha ¿ o que, segundo ela, vai permitir ao Brasil fazer subir ¿o leilão¿ nos próximos meses, sobretudo na questão de transferência de tecnologia. Masson disse que todos os grandes contratos da França hoje, sobretudo com os países asiáticos, têm transferência de tecnologia

Deborah Berlinck

O GLOBO: O que representa para a indústria de armamentos da França este contrato para compra dos aviões Rafale? Vai salvar a Dassault?

HÉLÈNE MASSON: No caso de venda dos caças Rafale, o Brasil será para a Dassault o primeiro cliente para exportação. Isso representa uma etapa essencial que permitirá ao construtor francês demonstrar que sua oferta pode rivalizar com as ofertas de seus principais concorrentes.

Também vai facilitar a assinatura de outros contratos de venda do aparelho. Num contexto de baixa das atividades civis da Dassault Aviation (queda na venda de aviões civis), exportar é uma prioridade e deve permitir manter o plano de investimentos das usinas industriais francesas.

A barganha em torno do preço, transferência de tecnologia e produção começou e deverá durar 9 meses: a batalha está ganha para a Dassault ou ainda não?

MASSON: Se as declarações políticas das autoridades francesas e brasileiras parecem posicionar o Rafale na frente, a pressão é grande hoje em relação ao preço e, sobretudo, aos compromissos que a França assumiu na questão de transferência de tecnologia.

Os Estados Unidos e a Suécia continuam na disputa, o que permite às autoridades brasileiras fazer subir o leilão na questão de transferência de tecnologia durante os meses de negociação daqui para frente. É um jogo de xadrez!

A parceria estratégica com o Brasil implica transferência de tecnologia, vai além das vendas de caças e a fabricação de submarinos . O que a França ganha com isso?

MASSON: Porque é uma parceria estratégica, a França ganha posição num mercado em expansão e permite assim a seus industriais da área de Defesa, como a Dassault Aviation, DCNS, Eurocopter e outros, conquistarem novas partes do mercado diante de seus concorrentes. O que está em jogo é ainda mais importante se consideramos que os orçamentos de defesa estão em baixa na Europa.

A transferência de tecnologia não está sendo feita só com contratos com o Brasil.

Hoje todos os grandes contratos de armas, sobretudo com os países asiáticos, têm cláusulas de transferência de tecnologia, que se tornaram um critério importante para vencer no mercado de exportação. São contratos que necessitam de compromissos e de concessões cada vez mais importantes.

Além disso, a parceria estratégica FrançaBrasil ilustra a vontade manifestada pela França desde 2007 de dinamizar o dispositivo de apoio às exportações de armas.

Contratos com que países da Ásia já se beneficiam de transferência de tecnologia?

MASSON: É o caso de contratos com a Índia, Paquistão, Coréia do Sul, Cingapura, entre outros.