Título: No rastro dos desaparecidos
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 04/04/2009, Política, p. 7

Procuradoria da República na cidade gaúcha de Uruguaiana vai pedir a abertura de inquéritos para investigar sumiços durante o regime militar

Ivan Cláudio pediu relação de familiares à comissão de mortos e desaparecidos do Ministério da Justiça Depois de mais de 30 anos, o desaparecimento de pessoas durante a ditadura será investigado criminalmente. A Procuradoria da República em Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, vai pedir a abertura de vários inquéritos para apurar as circunstâncias em que dezenas de brasileiros morreram ou sumiram no regime militar. Até então, apenas um inquérito havia sido instaurado para investigar o sequestro de três cidadãos ítalo-argentinos pela Operação Condor, desencadeada pelos países do Cone Sul para reprimir os movimentos de esquerda.

O procurador da República em Uruguaia, Ivan Cláudio Marx, encaminhou esta semana um ofício à Comissão de Mortos e Desaparecidos do Ministério da Justiça pedindo a relação de familiares de pessoas que sumiram na Região Sul do país. ¿Nós abrimos um inquérito onde os alvos das investigações eram os cidadãos ítalo-argentinos que desapareceram na fronteira. Porém, agora os trabalhos serão mais abrangentes, e o foco será apenas em torno dos brasileiros¿, afirma Marx. Segundo ele, a apuração do paradeiro das vítimas do regime militar começará a partir das informações solicitadas ao governo federal.

No primeiro inquérito, o Ministério Público e a Polícia Federal tentaram localizar informações sobre Manuel Lourenço Vinhas, Horácio Domingos Campiglia e um padre não identificado. Perseguidos na Argentina, por supostamente pertencerem ao grupo peronista Montoneros, eles se refugiaram em Uruguaiana, onde foram presos pelas autoridades brasileiras e entregues ao seu país. A ação fazia parte de acordos feitos principalmente entre argentinos, brasileiros, chilenos e uruguaios para reprimir a atuação de esquerdistas na América do Sul, naquela que depois veio a ser conhecida como Operação Condor.

Mesmo tendo em mãos documentos enviados por autoridades italianas, o procurador da República em Uruguaiana não conseguiu avançar nas investigações da Operação Condor. A Justiça da Itália determinou a prisão de vários oficiais brasileiros, acusados de terem participado das ações repressivas. ¿As informações que recebemos eram muito genéricas e não diziam quem seriam os agentes participantes dos atos, mas apenas os comandantes das unidades onde supostamente isso ocorria¿, afirma Marx.

Os inquéritos propostos por Marx poderão abrir precedentes em outros estados. Até agora, apenas uma ação civil pública estava sendo movida pelo Ministério Público em São Paulo contra o coronel Carlos Alberto Ustra, acusado de chefiar o DOI-Codi na capital paulista. O órgão era um dos braços da repressão usado pelos militares. Procuradores alegam que os supostos atos praticados por Ustra quando esteve à frente da corporação não prescreveram e poderiam ser enquadrados como crimes contra a humanidade. Parte da Justiça do estado não entende da mesma forma e rejeitou a abertura de processos.

Outra ação estava em andamento na Bahia, onde documentos oficiais do regime militar foram encontrados queimados dentro da Base Aérea de Salvador. O processo foi arquivado pelo próprio Ministério Público no estado, que alegou não haver o que investigar fora da esfera militar, já que não havia indícios de que a queima tenha sido praticada por civis. A Aeronáutica abriu procedimento interno.