Título: Sobe o emprego e cai a educação
Autor: Almeida, Cássia; Batista, José Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 19/09/2009, Economia, p. 27

País cria mais vagas com carteira mas analfabetismo ainda atinge 14,2 milhões

COM CARTEIRA: Após 18 anos na informalidade, a gaúcha Sandra Basler (no alto), conseguiu emprego com carteira assinada. Feito conseguido também por Fernando Antônio, que trabalha como guincheiro em obra na Tijuca. O setor de construção foi o que mais empregou

OO mercado de trabalho brasileiro cresceu, ficou menos desigual e com menos crianças e adolescentes em 2008. Esse foi o retrato que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o maior levantamento anual das condições de vida do brasileiro, captou em setembro do ano passado, às vésperas de crise financeira internacional desembarcar com força no Brasil. Na educação, porém, houve frustração com a estagnação na taxa de analfabetismo, mazela que ainda atinge 14,2 milhões de brasileiros acima de 15 anos, conforme divulgou ontem o IBGE. E o saneamento, apesar de ter subido de 51,1% para 52,5%, ainda é a dívida a ser paga. Mas os domicílios ficaram mais equipados com computador, internet, celular e a máquina de lavar.

- A continuidade da melhoria de emprego, renda, formalização e desigualdade é a característica marcante de 2008 - disse o presidente do IBGE, Eduardo Nunes.

A taxa de desemprego desabou em 2008. A parcela de trabalhadores desocupados ficou em 7,2%, quando se exclui o Norte rural. No ano passado, ficara em 8,2%. A taxa de 7,2% é a menor desde 1996, "o melhor momento no pós-Real", lembra o economista Lauro Ramos, do Ipea. Quando se inclui o Norte rural, essa taxa cai de 8,1% para 7,1%.

A carteira de trabalho foi a marca de 2008. Das 2,496 milhões de vagas abertas no ano, 2,1 milhões foram com carteira assinada. A alta foi de 7,1%, a maior nos últimos anos, de acordo com Cimar Azeredo, gerente da Integração da Pnad. O rendimento também foi recorde. O valor médio real ganho pelo trabalhador alcançou R$1.036. Quando se exclui o Norte rural, chega-se a de R$1.041, alta de 1,7%, o mais alto desde 1998. O rendimento vem subindo desde 2005 e já acumula alta de 17,4%.

Construção civil empregou mais

Ramos afirma que a diferença de 1996 e 2008 está na qualidade do emprego, mais formal:

- É o quinto ano seguido de melhora no mercado de trabalho, o que permitiu que a taxa de desemprego em 2009 não crescesse, mesmo com a crise. Esse ciclo de melhora criou um colchão de proteção contra a crise.

Para o economista Marcos Lisboa, outros fatores ajudaram na formalização do emprego, como reformas institucionais importantes.

- O fim da cumulatividade do PIS/Cofins estimulou a formalização. A empresa só consegue deduzir as despesas no imposto a pagar se seus fornecedores estiverem formalizados. Alem disso, o desenvolvimento do mercado de capitais e o bom momento relativo da economia brasileira beneficiam empresas formalizadas.

Com a alta do emprego formal, a parcela de ocupados que contribui para a Previdência Social subiu de 50,6% para 52,1%. Foram mais 2,6 milhões que passaram a contribuir.

A vida da gaúcha Sandra Garcia Basler, de 46 anos, mudou em agosto de 2008, quando teve a carteira de trabalho assinada. Havia 18 anos que Sandra só trabalhava na informalidade. A Região Sul registrou a menor taxa de desemprego do país de 4,9%. Mãe de dois filhos e com um enteado, ela comemora:

- Agora tenho direito à aposentadoria, férias, fundo de garantia, décimo terceiro salário.

A construção civil foi o setor que mais impulsionou o crescimento do emprego, com alta de 14,1% nos postos de trabalho, para 6,905 milhões em 2008. O resultado fez com que fosse ultrapassado o número de empregadas domésticas no Brasil, que caiu para 6,626 milhões. Para o operário da construção civil, Fernando Antônio de Farias, a diferença, agora, é o aumento da contratação com carteira assinada, o que aconteceu com ele há pouco mais de dois meses:

- Dá para sentir que as contratações com carteira estão retomando o ritmo.

Os dados da Pnad também mostraram que houve forte redução no número de trabalhadores por conta própria. Em 2007 este grupo somava 19,055 milhões de pessoas. No ano passado, a parcela caiu para 20,2% e a renda ficou 4,8% menor.

- Isso demonstra que, com o mercado formal crescendo, as empresas foram contratar as pessoas que atuam por conta própria e selecionou os melhores - disse o chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV) Marcelo Neri.

Para o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, embora a desigualdade no mercado de trabalho tenha caído pouco em 2008, o importante é que ela continuou caindo e já é 10% menor nos últimos dez anos.

- O Brasil cresce em termos sociais nos mesmos níveis que a China cresce em termos econômicos - disse ele, destacando o papel do Bolsa Família na redução da desigualdade.

COLABORARAM Cristiane Jungblut, Martha Beck e Lucianne Carneiro