Título: Bolsistas não retornam do exterior e dão calote
Autor: Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 20/09/2009, O País, p. 8

TCU apurou que pesquisadores devem ao CNPq e à Capes R$81,1 milhões; governo reconhece dificuldade de cobrança

BRASÍLIA. Em processos concluídos neste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) apurou um calote de R$13,2 milhões com 25 bolsistas brasileiros que, enviados ao exterior para fazer doutorados e pesquisas, decidiram não retornar ao país e não reembolsar o governo pelas despesas. De 2002 até hoje, a Controladoria Geral da União (CGU) já recebeu dezenas de "tomadas de conta especiais" sobre irregularidades praticadas por bolsistas no exterior e no Brasil. Considerando os valores registrados, sem correção ou juros, pesquisadores devem ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e à Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) R$81,1 milhões.

Mas o tamanho real do calote causado pela evasão de cérebros financiada pelo estado nunca foi levantado. Após 1999, o CNPq detectou 339 casos de bolsistas que não regressaram ao país. Os casos passam por auditoria interna e depois seguem para julgamento, geralmente à revelia, no TCU. As cobranças são feitas por via judicial, com pouco sucesso.

O GLOBO localizou mais de 200 acórdãos no tribunal sobre o tema. A análise dos 27 casos julgados em 2009 revela dívidas que variam de R$169 mil a mais de R$1 milhão, de 25 pesquisadores expatriados desde 1992. Apenas dois casos foram arquivados.

Cláusula de retorno para garantir fomento acadêmico

A cláusula de retorno é a condição da bolsa que pretende garantir o fomento acadêmico nacional: os beneficiados são obrigados a passar igual período no Brasil, repassando os conhecimentos adquiridos lá fora. Vários desses pesquisadores vivem e trabalham em outros países - alegam melhores condições financeiras e de trabalho - e acabam ignorando os longos e burocráticos processos dos quais são acusados. O próprio governo reconhece a quase impossibilidade de reaver os recursos.

Com um investimento anual médio de US$30 milhões, o Brasil mantém de 300 a 500 pesquisadores em programas de doutorado, pós-doutorado, doutorados-sanduíche e estágios - o pagamento é de cerca de até US$2,1 mil por mês. Os países mais populares são os Estados Unidos (35%), Inglaterra (14%) e França (13,5%). Em 2008, a Capes tinha 4.135 bolsistas e o CNPq, 551.

- O ressarcimento de custos é difícil. É um risco inerente aos investimentos em pesquisa. Já cogitamos algumas soluções, como o oferecimento de garantias ou avais, sem prejudicar bolsistas de baixa renda - disse Luiz Navarro, ministro-interino da Controladoria Geral da União (CGU).

O CNPq considera que o volume histórico dos "caloteiros" é baixo. De 1982 até 1998, os 266 bolsistas que não voltaram ao Brasil representaram menos de 1% do total de benefícios desse tipo. As principais justificativas apresentadas pelos pesquisadores para o êxodo são as dificuldades em conseguir trabalho compatível ou bem remunerado no Brasil, consequências às vezes da extrema especialização.

Alguns se queixam de que a vaga de trabalho, em empresa ou universidade, deve ficar reservada como contrapartida e incentivo ao retorno. O TCU já recomendou estudos sobre a contratação obrigatória desses bolsistas em universidades brasileiras.