Título: G-20 pedirá coordenação contra crise
Autor: Scofied Jr., Gilberto; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 20/09/2009, Economia, p. 27

Brasil defenderá maior participação de emergentes em FMI e Banco Mundial

WASHINGTON e BRASÍLIA. Os sinais de que o mundo já ultrapassou o período mais crítico da crise econômica farão com que os líderes dos países do G-20 - que estarão reunidos nos próximos dias 23 e 24 em Pittsburgh, nos EUA - se concentrem agora na esperada regulamentação coordenada do sistema financeiro internacional, segundo analistas que acompanham o encontro. Pela primeira vez, também, os líderes devem começar a falar sobre uma "saída estratégica" (igualmente de forma coordenada) do que muitos consideram uma bomba relógio: o déficit público e o elevado endividamento de países, especialmente da Europa e dos Estados Unidos.

Isso porque desmontar os pacotes de gastos públicos e estímulos ficais e monetários - lançados para combater a crise - pode ser prejudicial à economia global, se esse movimento for executado de forma descoordenada e fora do momento considerado ideal. O dilema, segundo os especialistas, é saber o tempo exato para retirar os estímulos: se a ação for muito rápida, pode afetar a economia mundial que ainda luta para se manter de pé. Se for muito demorada, o perigo do retorno da inflação alta é grande.

- A preocupação dos líderes será a coordenação tanto para calibrar o recuo dos pacotes de estímulo quanto na regulação dos mercados financeiros. Dada a natureza global desses mercados, uma ação coordenada é essencial para que recursos não fujam de um país que decidiu aplicar uma regulamentação mais rígida para outro que não tenha regulamentação alguma - disse Charles Dallara, diretor-gerente do Instituto Internacional de Finanças (IIF).

Lula quer que G-20 se torne principal fórum econômico

O IIF enviou carta ao presidente dos EUA, Barack Obama, e sua equipe econômica, pedindo que ele fale aos presidentes reunidos em Pittsburgh sobre a importância da coordenação. "O G-20 deve usar a oportunidade do encontro de Pittsburgh para sustentar políticas que consolidem a recuperação econômica, articulem estratégias de saída com credibilidade e criem um grupo de trabalho com o papel central no Fundo Monetário Internacional (FMI) para resolver os desequilíbrios financeiros globais", diz a carta.

- Os bancos centrais já perceberam que regulamentação sem coordenação não funcionará - disse David Wessel, editor de economia do jornal americano " Wall Street Journal".

No discurso que fará na reunião do G-20, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também defenderá a manutenção dos pacotes de incentivos fiscais, que, no caso brasileiro, ajudaram a garantir a sobrevivência da indústria local e o poder de compra dos consumidores. Mas pedirá cautela quanto às ações para sair da crise.

- Não se pode interromper prematuramente as políticas nacionais de incentivos. O Brasil não quer que o foco do G-20 se vire prematuramente para as chamadas estratégias de saída - comentou um integrante da equipe econômica que participa das negociações.

Ao lado de líderes de China, Índia, África do Sul e outras nações emergentes, Lula também vai defender que o G-20 e não mais o G-8 - que reúne os sete países mais ricos do mundo e a Rússia - se consolide como fórum mundial para discutir os grandes temas econômicos. Essa espécie de institucionalização do G-20 seria o reconhecimento da importância dos países em desenvolvimento na mitigação da crise internacional.

Os países emergentes também vão ao encontro para cobrar resultados. Para Lula, em meio a boas notícias que mostram a recuperação das nações desenvolvidas, teme-se que, com a recuperação das economias do Hemisfério Norte, os ricos desistam de dar prosseguimento aos compromissos assumidos no auge da crise, em Washington, no fim de 2008, e em Londres, em abril deste ano.

UE insiste em teto para bônus de executivos

Os emergentes não querem apenas a reforma do sistema financeiro internacional. Reivindicam o aumento de suas participação nas decisões dos organismos multilaterais de crédito. No FMI, a proposta é de uma expansão de sete pontos percentuais na participação dos votos. Assim, os ricos reduziriam sua fatia dos atuais 60% para 53%, e as nações em desenvolvimento passariam a deter 47% dos votos.

- A participação dos países em desenvolvimento no PIB mundial é praticamente a mesma dos desenvolvidos. Por isso, queremos peso semelhante no FMI e no Banco Mundial - disse uma fonte da área econômica do governo brasileiro.

Os europeus, porém, insistem na questão do pagamento a executivos do setor financeiro. Na quinta-feira passada, os 27 países da União Europeia concordaram que a regulamentação tem de estabelecer limites para isso, incluindo regras claras sobre o recebimento de bônus. França e Alemanha defendem o adiamento da bonificação dos executivos, cancelamento nos casos em que os bancos tenham desempenho ruim e teto para remuneração de dirigentes do setor.

- A Europa está unida em torno de uma forte mensagem política - afirmou o presidente da França, Nicolas Sarkozy, após a reunião da UE.

Boa parte do público europeu e americano não consegue entender por que executivos de bancos continuam recebendo gratificações e bônus milionários, mesmo quando o desempenho das instituições é ruim ou o banco enfrenta problemas de solvência. Mas especialistas avaliam que a bandeira do G-20 sobre a reforma dos organismos multilaterais é relevante.

- Será triste se a reunião de Pittsburgh se limitar a discutir o contracheque dos banqueiros - afirmou Edwin Truman, pesquisador do Peter G. Peterson Institute for International Economics. - Os líderes têm que sair da reunião com consenso sobre a situação da economia mundial, como será a regulamentação do sistema financeiro e como serão as mudanças esperadas no FMI e no Banco Mundial.

(*) Correspondente