Título: Redução do superávit fiscal dispara alerta para gasto público em 2010
Autor: Duarte, Patrícia; D'Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 22/09/2009, Economia, p. 22

Para analistas, ano eleitoral preocupa. Mantega diz que projeções são "conversa fiada

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A redução da meta de superávit primário (economia feita pelo país para o pagamento de juros), anunciada sexta-feira pelo governo, não chega a assustar os especialistas a curto prazo, mas acendeu a luz amarela sobre como os gastos públicos serão geridos nos próximos anos. Mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, classificou as projeções de analistas de mercado de que o governo não conseguirá cumprir as metas de superávit primário em 2009 e 2010 de conversa fiada.

Segundo Mantega, os gastos do governo em ações contra a crise custaram o equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país). Mas essas medidas, disse, permitiram que, em vez de retração entre 2% e 3%, a economia feche o ano com crescimento de 1% do PIB.

¿ Essa história de que nós não vamos cumprir o (superávit) primário é uma projeção infundada ¿ disse o ministro ontem na abertura do 6oFórum de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Especialistas ouvidos pelo GLOBO admitem que, com a crise global, o governo agiu certo ao elevar seus gastos e dar incentivos fiscais. Mas ressaltam a queda na arrecadação de impostos e contribuições.

¿ Crise justifica aumento de gastos. Mas, em 2010, quando a economia já estiver recuperada, fica a dúvida de que o governo vai reduzir seus gastos. É um ano eleitoral ¿ afirmou o economista-chefe da corretora Concórdia, Elson Teles.

Baixa execução do PAC pode afetar meta do governo A crítica de que os gastos do governo são correntes e permanentes também se mantém entre os especialistas. Para eles, o ideal seria o governo centrar fogo em investimentos, sobretudo em infraestrutura ¿ uma forma de gasto que não se perpetua e permite maior atividade econômica.

¿ O governo tem de adotar regras mais claras para os investidores, indicando que a carga tributária não vai crescer ¿ disse o consultor do Itaú Unibanco, Tomas Malaga.

Mantega negou que o governo tenha modificado as metas de superávit fiscal, que recuou de 3,3% para 2,5% do PIB. E afirmou que o governo deve abater este ano do cálculo do superávit, pela primeira vez, gastos com obras incluídas no Projeto Piloto de Investimentos (PPI).

Para o ministro, a inclusão dos gastos do Minha Casa, Minha Vida e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no PPI ¿ que elevará para cerca de 0,45% do PIB os investimentos descontados do cálculo de superávit primário ¿ não compromete a transparência fiscal do governo.

Para cumprir a meta de superávit primário de 3,3% do PIB em 2010, Mantega disse já ter avisado os ministérios das restrições a aumento de gastos.

¿ Não será fácil fazer o primário, nem neste nem no próximo ano. Isso implica alguns sacrifícios ¿ admitiu, adiantando que os programas sociais e o PAC ficarão de fora.

Mas a baixa execução do PAC deve comprometer esse propósito.

Até o dia 10, apenas 31% dos recursos do PAC tinham sido executados, já incluídos os restos a pagar (despesas de anos anteriores). Dos R$ 21 bilhões autorizados, a execução era de apenas R$ 6,6 bilhões. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2009 prevê meta equivalente a 1,4% do PIB para o governo central.

A previsão inicial do Orçamento era deduzir R$ 15,6 bilhões do PPI, equivalente a 0,51% do PIB. Na sexta-feira o governo propôs ampliar esse abatimento para 0,94% do PIB, ou R$ 28,5 bilhões.

Meirelles: `O mercado às vezes erra¿ Só que, como a dedução leva em conta apenas gastos já realizados, para deduzir os 0,94% (da meta de superávit de 1,4%) o governo teria de executar em três meses e 20 dias mais R$ 21,9 bilhões em investimentos.

O presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, disse estar ¿analisando com cuidado a evolução do superávit primário¿. Mas minimizou a mudança na fórmula de cálculo, ao dizer que ¿quando o BC modela o comportamento da economia para suas projeções de inflação, já leva em conta todos esses fatores¿. Sobre a recente escalada dos juros futuros, ele disse que ¿o mercado faz as suas apostas e às vezes erra¿: ¿ Não compete ao BC se pronunciar sobre as curvas (dos juros).

Meirelles disse que o crédito voltou ao nível pré-crise e antecipou (a divulgação oficial será semana que vem) que nos primeiros 28 dias de agosto a média diária ficou ¿próxima de R$ 7 bilhões¿. Em julho, caíra de R$ 7,3 bilhões para R$ 6,6 bilhões