Título: Nada se aprendeu
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 25/08/2007, O Globo, p. 2

O julgamento em curso no STF vai nos recordando todas as transgressões cometidas pela camarilha petista que, supostamente em busca de apoio parlamentar, e em conluio com agentes do interesse próprio, como Marcos Valério e o Banco Rural, enlameou o Parlamento e o próprio partido. As barganhas, evita-se dizer, não são inaugurais no sistema político. O espantoso na conduta do grupo de petistas, plebeus recém-chegados ao poder, é terem sido capazes de ultrapassar os antecessores, chegando ao uso da propina nas barganhas que sempre caracterizaram o sistema. Mas, apesar do que houve, a reforma política não saiu.

E, com isso, estão intactos os genes do fisiologismo, da desconexão dos partidos com os eleitores, do financiamento privado destinado à retribuição pelo uso do Estado, prontos para a geração de novos delitos políticos.

Ao fim e ao cabo, após tantos discursos e o esforço, é justo reconhecer, do presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, podemos ter apenas duas fatias de reformas, aprovadas inicialmente esta semana no Senado. Na quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça aprovou a emenda constitucional de Marco Maciel, estabelecendo a fidelidade partidária para valer, e a de Jarbas Vasconcelos, proibindo as coligações em pleitos proporcionais, estas que nos fazem votar em A e eleger B.

A emenda de Maciel pune a troca de partido com perda de mandato, e sobrepõe-se ao projeto aprovado pela Câmara, na semana passada, que adota uma fidelidade mitigada e vacina contra a perda de mandato os 38 deputados que este ano cruzaram a fronteira da oposição rumo à base governista. A CPI dos Correios, que não conseguiu provar quem são mensaleiros - descobrindo apenas os petistas e dirigentes partidários que receberam transferências do valerioduto -, talvez descobrisse mais se tivesse investigado os deputados que mudaram de partido em 2003. As transferências, hoje alguns petistas admitem, teriam se originado mesmo de ajuda eleitoral prometida e não paga. Em horas de aperto do governo para votar matérias, os credores (partidos da base) usaram a faca e exigiram o pagamento. Delúbio pagou.

A fidelidade é, portanto, um freio na corrupção política. O Senado deve rejeitar o projeto da Câmara para forçar a votação da emenda Maciel. O projeto tenta evitar que o Supremo decrete, em sintonia com o TSE, a substituição dos 38 por seus suplentes. A fidelidade mitigada da Câmara pune o infiel apenas com a inelegibilidade por quatro anos, ao fim do mandato em que houve a troca. Abre ainda uma brecha: nos anos que antecedem a pleitos eleitorais, seria permitida a troca de partido até 30 de setembro. A festa de sempre.

A emenda Maciel ficou ainda mais dura com as quatro mudanças propostas por Antonio Carlos Valadares (PSB-SE). Uma delas estendeu a exigência aos ocupantes de cargos executivos, outra determinou que os suplentes sejam sempre do mesmo partido, para assegurar a titularidade ao partido em caso de infidelidade.

A emenda de Jarbas, com substitutivo de Tasso Jereissati, proíbe as coligações nas eleições para deputados e vereador, ficando permitida para a disputa de cargos executivos. Os partidos ideológicos serão punidos pelo que têm feito as siglas de aluguel: amasiam-se com partidos grandes, elegendo deputados que não elegeriam sozinhos. Como diz Jarbas, "sua implantação tornará mais claro o quadro partidário e mais transparente, sobretudo para o eleitor, a representação política". O maior defeito do sistema nem está na pulverização dos partidos, está no divórcio entre eles e os eleitores. Isso favorece varejões e mensalões. São boas medidas, mas terão ainda de ser aprovadas em dois turnos pelo Senado, antes de seguirem para a Câmara. Ou seja, a classe política não aprendeu nada com o escândalo de novo em cartaz no STF.