Título: Curvas do vento
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 26/08/2007, O Globo, p. 2

Eles, políticos e servos da política, gostam de atribuir à imprensa suas próprias especulações sobre o futuro ainda distante e os cenários ainda em formação, como se fosse possível ocultar que só o poder os move. O segundo mandato de Lula tem apenas oito meses, mas ele já cuida não só da eleição municipal de 2008 como da própria sucessão. Sabe que tem no máximo um ano e meio de desfrute pleno do poder. Na segunda metade, começa a concorrência dos que encarnam a perspectiva de poder, sejam aliados ou adversários. Governantes que não preparam a sucessão antes disso, costumam ser atropelados.

As conversas de Lula são ambíguas, permitem qualquer conclusão, como observou Arlindo Chinaglia ao fim de uma delas, na terça-feira passada. Mas, o que transpira sugere, por exemplo, que a sucessão com um petista afasta-se cada vez mais de seu horizonte. E, por isso mesmo, a disputa já começa a se instalar precocemente no partido.

Na quarta-feira (dia seguinte ao jantar com os governadores petistas, com os quais falou claramente sobre a hipótese de apoio a Ciro Gomes ou um outro aliado em 2010), sabendo que o governador tucano Aécio Neves estava em Brasília, mandou chamá-lo para um café. Falaram de CPMF e, ao final, Lula teria disparado.

- Você sabe que ainda não há candidato do lado de cá. Sabe que o jogo com Serra vai ser pesado. Você tem que ir para o PMDB, que é louco por você!

O tucano teria feito, como outras vezes, ouvidos moucos. Talvez os tape com cera, como Ulysses, para não ouvir o canto das sereias. Aécio tem dito que, se tiver de ser candidato, será pelo PSDB. Mas ali, como no PT, a cobra já está fumando. Serra agora planeja um programa de privatizações, que lhe dariam recursos para turbinar o governo, sem medo das patrulhas que intimidaram Alckmin em 2006.

Lula não chega a dizer que apoiaria Aécio. O que parece desejar é uma terceira via que rompa a polaridade PT-PSDB. Contra a dicotomia, tem feito acenos até ao duro líder tucano Arthur Virgílio. Teria feito chegar-lhe a disposição de facilitar sua reeleição ao Senado em 2010, quando estarão em disputa duas vagas de senador em cada estado. O bloco lulista lançaria apenas um candidato, o governador Eduardo Braga, deixando a outra vaga para o tucano. Mas, neste momento, Lula atua para atrair senadores da oposição que ajudem o governo a aprovar a CPMF. E não faltam senadores desconfortáveis em seus partidos, como Edison Lobão (DEM-MA) e Romeu Tuma (DEM-SP).

A primeira sucessão sem Lula no páreo desde 1989 promete lutas de foice, principalmente no PT ,onde já está começando. Um chamado "grupo dos seis", composto por deputados que apóiam a candidatura da ministra Marta Suplicy, vem atuando com desenvoltura crescente. São eles Ricardo Zaratini Filho (da tendência Novos Rumos), Gilmar Tato, Candido Vaccarezza, Devanir Ribeiro e José Mentor, da tendência PT de Luta e de Massas.

O ministro Tarso Genro guarda para si o sonho de que um sucesso do Pronasci abra-lhe uma estrada mais larga no PT, onde é rejeitado pela Unidade na Luta, o grupo majoritário que não o perdoa pela defesa de expurgos no auge da crise de 2005. Jacques Wagner continua a depender do sucesso da gestão baiana e Dilma Rousseff, como candidata, seria uma miragem. Enquanto eles se armam, Lula começa a pensar em Jobim.