Título: Aberração
Autor: Itagiba, Marcelo
Fonte: O Globo, 27/08/2007, Opinião, p. 7

Se vier a ser consumada no Congresso Nacional, a prorrogação até 2011 da famigerada CPMF ocorrerá em desrespeito a preceitos constitucionais e ao arrepio da própria certidão de nascimento que a criou, a Emenda Constitucional 12/96, cujo parágrafo 4º do artigo 74 estabeleceu que "a contribuição terá sua exigibilidade subordinada ao disposto no art. 195, parágrafo 6º da Constituição, e não poderá ser cobrada por prazo superior a dois anos".

A CPMF é uma aberração política de viés tributário. A imperfeita "comunhão" entre os Poderes Executivo e Legislativo gerou um monstro que hoje devora o povo brasileiro, engolido pela bocarra da elevada carga tributária.

A discussão sobre a prorrogação da CPMF está submetida a um deplorável festival de incoerências. Os que estavam no poder, quando entrou em vigor, hoje se opõem à sua manutenção. Os antigos oposicionistas, hoje, a defendem. São Madalenas arrependidas que agora fazem profissão de fé contra ou a favor da cobrança.

A situação tenta ampliar a vigência de uma contribuição originariamente provisória que já funciona como imposto, que ignora o pacto federativo e é aplicada de maneira injusta, ao tratar desiguais - ricos e pobres - de forma igual, com a sua alíquota única para toda e qualquer movimentação bancária. Reconhecê-la como imposto implicaria dividir o bolo com estados e municípios.

A oposição quer extingui-la. Mas, quando foi poder, defendeu a contribuição/imposto eivada de um igualitarismo tributário absolutamente perverso e contrário ao que Rui Barbosa preconizou em sua máxima segundo a qual o Estado deve tratar de forma desigual aqueles que são desiguais.

Criada em 1996, na forma de contribuição provisória destinada a injetar mais recursos no combalido sistema público de saúde, a CPMF jamais cumpriu tal missão social. Consolidou-se como mais um imposto da enorme carga tributária que acua os investimentos, trava o desenvolvimento e retrai a geração de empregos no país.

Como muito bem manifestou o senador Francisco Dornelles, com base em cálculos do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, "os brasileiros pagam muitos impostos, sem saber e sem ter como deles fugir". Por isso, é dever do parlamentar revelar aos cidadãos o quanto pagam em impostos, apontar quais são as tributações excessivas ou ilegais, e lutar pelo fim delas.

A CPMF tem patas, rabo, juba, boca de leão, e morde como um leão; mas dizem que não é leão. A CPMF é um imposto.

MARCELO ITAGIBA é deputado federal (PMDB-RJ).