Título: O que esperar de 2008
Autor: Paul, Gustavo e Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 27/08/2007, Economia, p. 21

Analistas prevêem que economia do país vai continuar crescendo, mas em ritmo menor.

Aquatro meses do fim do ano, já é consenso entre os analistas que os brasileiros sentirão saudades de 2007. A boa notícia é que 2008 também surge no horizonte como um ano bastante positivo, apesar de não apresentar o mesmo brilho. Nas últimas décadas, foram raros os momentos reunindo simultaneamente crescimento econômico - que deve situar-se em torno de 5% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) - com inflação controlada.

Essa conjunção deverá se manter no ano que vem, mesmo com a ressaca da crise financeira de agosto. A expectativa de analistas ouvidos pelo GLOBO é que o país cresça cerca de 4% em 2008 - um patamar razoável se comparado ao desempenho médio dos últimos anos. No entanto, todos fazem uma ressalva: o quadro pode mudar caso a crise se agrave.

A razão do otimismo é o vigor do mercado interno, que será a principal âncora da economia em 2008, a exemplo do que vem ocorrendo nos últimos meses. Uma série de indicadores mostra a força do mercado doméstico, que já responde por dois terços do crescimento do PIB.

- Estamos muito bem posicionados. O consumo interno está baseado na melhoria de renda, e no crescimento do crédito e do nível de emprego. E ainda temos uma taxa de crescimento que moverá a economia - avalia Nicola Tingas, economista-chefe da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban).

Bancos manterão crédito farto

Outra razão que explica o aquecimento do mercado interno é a expansão do crédito, impulsionada por sucessivos cortes na taxa básica de juros, a Selic. Em setembro de 2005, ela estava em 19,75%. Em julho passado, havia caído para 11,5%, facilitando a oferta de recursos aos consumidores brasileiros. A maior disponibilidade de crédito e o aumento da demanda fizeram sua participação no PIB subir de 25% para 33% nos últimos dois anos.

O professor Juan Jensen, economista da consultoria Tendências, lembra que os bancos brasileiros não foram afetados pela crise financeira mundial e continuarão com excesso de dinheiro para emprestar. Por isso, apesar de as projeções da consultoria para o mercado interno apontarem um desempenho menor em 2008, ainda estão em patamares elevados.

O crescimento econômico, aliado à inflação baixa e aos juros em queda, resultou no aumento do nível de emprego: a variação da população ocupada cresce desde 2004. Segundo o professor Antonio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP, nos últimos 12 meses a população ocupada cresceu 2,7%. Outro fator positivo são as negociações salariais. Dados divulgados este mês pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram que das 280 negociações salariais analisadas, 97% apresentaram reajustes equivalentes ou superiores à inflação.

- Esse fatos combinados têm provocado uma ampliação da massa salarial real, que aumentou 7,8% no acumulado dos últimos 12 meses, um padrão de crescimento chinês - avalia Lacerda.

Não é por menos que o governo vem repetindo como um mantra, desde o início da crise, que a turbulência financeira não trará seqüelas para o país. Em um evento para empresários na semana passada, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, foi enfático:

- O teste pelo qual estamos passando é extraordinário. Ainda que a economia dos Estados Unidos cresça só 1,5%, haja redução na taxa de crescimento da China e dos preços das commoditties, o ciclo econômico brasileiro é suficientemente robusto para sustentar o crescimento em torno de 4% - afirmou.

Mas o Brasil não está completamente imune à crise. O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, calcula que o superávit comercial deverá cair este ano para US$38,5 bilhões, ante US$46,1 bilhões em 2006. A razão é a redução dos preços das commodities metálicas, tendo em vista que a crise imobiliária americana afetará diretamente o setor de construção civil. As commodities representam 65% da pauta de exportações brasileiras.

Outro alerta é o recente aumento da inflação, que pode interromper a seqüência de queda dos juros e jogar uma ducha de água fria no otimismo do setor produtivo. Em agosto, a alta dos preços nos alimentos fez com que o IPCA-15 desse um salto, passando de 0,24%, em julho, para 0,42%. O fato de as expectativas do mercado para a inflação de 2008 estarem em 4% - abaixo do centro da meta, que é 4,5% - ainda é um alento, mas mostra que o BC terá pouco espaço para reduzir os juros no próximo ano.

- A gente começa a ver inflação de preços de alimentos em todo o mundo, mas ninguém sabe onde isso vai parar - diz o economista Fábio Giambiagi, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Os diretores do BC também estarão de olho no mercado interno e na taxa de câmbio. Eles vão monitorar com lupa o aumento do consumo, para evitar que ele contagie a inflação. Outro foco é a movimentação do dólar. Se ficar entre R$1,90 e R$2, dizem os analistas, favorecerá as importações e conterá aumentos de preços internos. Se oscilar muito, afetará o humor e a confiança dos empresários, que poderão reajustar seus preços como uma medida preventiva.