Título: Parceria de emergentes protege de turbulência
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 06/09/2007, Economia, p. 27

SOB PRESSÃO: Órgão da ONU e a OCDE reduzem projeções para o crescimento global devido à crise nos EUA

Relatório da Unctad recomenda integração entre os países em desenvolvimento e criação de "FMIs regionais".

BRASÍLIA e PARIS. Os países em desenvolvimento devem estimular e consolidar parcerias regionais para se proteger das turbulências econômicas internacionais, como a que se abateu recentemente sobre os mercados. Essa integração incluiria a criação de instrumentos financeiros, como fundos monetários regionais. Essa foi a avaliação da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), ao divulgar ontem o Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento de 2007. Segundo o organismo, os desequilíbrios globais permanecem uma ameaça ao crescimento das economias - que devem ainda dar atenção a seus mercados domésticos.

A razão é o fluxo financeiro especulativo, motivado pelo crescente apetite de investidores por taxas de juros atraentes. Ao deslocar grandes somas de dólares para esses mercados, as moedas locais ficam supervalorizadas, aumentando a fragilidade das economias emergentes.

O relatório da Unctad foi elaborado antes do agravamento da crise das hipotecas de alto risco nos Estados Unidos, mas já antevia suas conseqüências. Segundo o documento, "o retrocesso no mercado imobiliário nos EUA e as dificuldades financeiras derivadas podem afetar a solvência das famílias e afetar o consumo privado".

A Unctad também prevê um crescimento global menor este ano: 3,4%, contra 4% em 2006. As exceções são o Brasil, cujo Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos) deverá crescer 4,5% (3,7% em 2006), Japão - 2,3% contra 2,2% - e África - 6% contra 5,6%. Nos países ricos, a taxa média de expansão será de 2,4%, em comparação a 3% no ano passado. Os EUA cresceriam apenas 2%, ante 3,3% em 2006.

- Há indícios de que o crescimento americano será ainda menor com a crise, mas não existem dados disponíveis - diz Renato Baumann, diretor no Brasil da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), responsável pela divulgação do relatório no país.

Acordos entre ricos e pobres não trariam benefícios

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) também reduziu ontem suas projeções de crescimento este ano para os países industrializados. Para os EUA, recuou de 2,1% para 1,9%. Já para a zona do euro, passou de 2,6% para 2,7%, e para o G-7, de 2,3% para 2,2%.

Os acordos regionais, como o Mercosul, na opinião da Unctad, facilitariam o comércio e o trânsito de mercadorias, além de incrementar o planejamento e o financiamento da infra-estrutura. Além disso, ressalta que projetos de pesquisa e desenvolvimento, normalmente caros para os emergentes, "podem ser viáveis se vários países unirem seus recursos".

A cooperação financeira regional poderia proporcionar ainda mecanismos de pagamento e crédito de curto prazo entre os respectivos bancos centrais, o que reduziria custos e pouparia divisas. Além disso, esses "FMIs regionais" forneceriam financiamento de longo prazo, com custo baixo e taxas menores, reduzindo o risco de inflação.

O relatório é incisivo ao avaliar que tratados comerciais entre ricos e pobres - como o Nafta, que envolve EUA, Canadá e México - não trazem os benefícios esperados em relação à abertura de mercado. "O tratamento especial e diferenciado é substituído por reciprocidade plena, e os países em desenvolvimento têm de aceitar um grau de liberalização no comércio de bens e serviços que vai além do acordado na OMC (Organização Mundial do Comércio)".

(*) Com agências internacionais