Título: Ligado a Moreira Franco e Jobim
Autor: Gois, Chico de e Franco, Ilimar
Fonte: O Globo, 29/08/2007, O País, p. 16

Direito é conselheiro da União dos Juristas Católicos do Rio, que é contra aborto.

Na noite de anteontem, o ministro Carlos Alberto Direito abriu mão de um dos seus raros momentos de prazer. Enquanto aguardava a confirmação de seu nome para a vaga de Sepúlveda Pertence no Supremo Tribunal Federal (STF), preferiu não comparecer à sessão semanal de filosofia com o professor argentino Júlio Cabrera. Há um ano, Direito e o ministro da Defesa, Nelson Jobim, estudam com o auxílio de Cabrera o "Tratado da natureza humana", do escocês David Hume.

São poucas as motivações para o ministro sair de casa. Em Brasília, a rotina diária no STJ. Em Copacabana, onde mora no Rio com a mulher e a sogra, os passeios com os netos e visitas a livrarias. Fora isso, só mesmo os debates de hora e meia com Cabrera e Jobim. Na obra, Hume procura demonstrar que a natureza humana não se move pela razão, mas pelo hábito da continuidade, e que o homem é um animal cultural, e não racional.

Mas teriam as sessões filosóficas alguma aplicação na rotina dos alunos, um às voltas com a crise aérea e o outro, futuramente, mergulhado nos processos da mais alta corte de Justiça brasileira? O professor de ambos acha que sim.

- O ministro Jobim gosta da aplicação da lógica, enquanto o ministro Direito está mais próximo da filosofia. Mas não é fácil encontrá-la na vida. Sua aplicação não é imediata - diz Cabrera, que leciona na UnB.

Casado com uma advogada e professora aposentada, três filhos (um deles juiz) e seis netos, o paraense Carlos Alberto Direito, de 64 anos, é um homem formal e de hábitos discretos. Não bebe, não fuma, não freqüenta festas. Ingressou na magistratura em 1989, indicado pelo então governador Moreira Franco para uma vaga de desembargador pelo quinto constitucional, como advogado.

Até o ano passado, ia às reuniões da União dos Juristas Católicos do Rio, do qual é conselheiro, mas este ano não apareceu. O presidente da entidade, o procurador Paulo Leão, se lembra do último encontro com a presença de Direito. Nela, disse Leão, o ministro defendeu a inclusão do estudo da ética no currículo obrigatório da graduação nas universidades.

Em seu site, a União não esconde que a luta contra o aborto é um de seus propósitos: "A entidade tem apoiado os movimentos que lutam pela defesa da vida desde a concepção. Subsídios são encaminhados a parlamentares no tocante à elaboração legislativa que se relacione com os valores e a ética cristã". Paulo Leão alega que a entidade quer que seja respeitada a vida da pessoa, "do início ao seu término", razão pela qual considera o aborto provocado uma forma de eliminar.

Aliada da ala conversadora da Igreja Católica, a União também se opõe a experiências com células-tronco embrionárias:

- Somos contra esta matança de embriões sob argumento de pesquisa. A possibilidade de cura é mera especulação - sustenta Leão.

O ex-ministro da Justiça Célio Borja, também conselheiro, diz que os temas morais não são a única agenda da entidade:

- Os conselheiros se reúnem para estudar temas ligados à atividade jurídica e questões da natureza religiosa. E praticar também atos religiosos.

A carreira de Direito começou política. Numa entrevista em 1988, ele disse que, aos 10 anos, já fazia comícios da varanda de casa para pessoas que passavam na rua. No colégio Anglo-Americano, conheceu Moreira Franco, um político com influência determinante na sua vida.

- Ele era do Movimento Solidarista Cristão e eu da Ação Popular - recorda-se o ex-governador fluminense.

Os dois ingressaram na vida pública quase na mesma época. Direito foi assessorar o ministro da Educação, Ney Braga, enquanto Moreira era eleito prefeito de Niterói durante o regime militar, nos anos 70. Depois, ambos voltaram a se encontrar no PMDB. Direito se candidatou a deputado federal em 1982. Mas o bordão descontraído da campanha, "vote Direito", não combinava com o tom solene, e o candidato não vingou eleitoralmente.

Quatro anos depois, Direito foi um dos coordenadores da vitoriosa campanha de Moreira para o governo do estado, em 1986. No ano seguinte, coube a Direito - que deixaria a presidência da Casa da Moeda para assumir a Secretaria de Educação - o desmonte de uma das máquinas de propaganda do brizolismo, os Cieps.

- Quando você privilegia os Cieps, está beneficiando uma parcela inferior a 5% da população em idade escolar no Rio - disse o então secretário, na época de sua posse.

Direito não ficou até o fim do governo. Em meados do ano seguinte, Moreira o indicou para o Tribunal de Justiça, iniciando ali uma carreira bem mais sólida com que a política. Moreira, como deputado federal, continuou contando com a ajuda de Direito, que o assessorou na relatoria da reforma administrativa. O ex-governador diz que foi um dos responsáveis, em 1996, pela indicação de Direito para ministro do STJ ao então presidente Fernando Henrique. Na época, outro amigo passou a ser uma presença essencial na vida dele: Nelson Jobim, então ministro da Justiça e um aliado central na disputa pela vaga no STF.

Professor titular de Direito Constitucional da PUC há 30 anos e autor de cinco livros, levou para o STJ um estilo que já exibia no TJ-RJ: a fidelidade às tradições legais, sem decisões surpreendentes. Na rotina do STJ, é sempre solene e formal.

- Ele é extremamente fiel ao direito posto. Nunca interpreta lei - diz um amigo próximo.

Fora dos tribunais, Direito leva uma vida discreta. Um dos filhos, o juiz Gustavo Direito, releva que o pai tem como hobby a paixão pela medicina.