Título: Jobim diz que militar que reagir terá resposta
Autor: Jungblut, Cristiane e Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 30/08/2007, O País, p. 15

Ameaça foi feita em lançamento de livro do governo que acusa as Forças Armadas de mortes e tortura no regime militar.

BRASÍLIA. Com a ausência dos três comandantes militares - que foram convidados, mas não apareceram - e na presença de ex-ativistas políticos que lutaram contra a ditadura, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou ontem o livro que faz balanço dos 11 anos de trabalho da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos e negou se tratar de revanchismo. Na solenidade, coube ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, falar em nome dos militares. Ele afirmou que as Forças Armadas consideravam o lançamento do livro natural e que não esperava reações, mesmo que isoladas. Mas alertou que, se houver, não serão bem-vindas.

Jobim lembrou que, quando ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1995, discutiu inclusive com os militares a Lei dos Desaparecidos Políticos, que foi aprovada pelo Congresso dentro do "princípio de reconciliação e pacificação nacional".

- Hoje, não naquela condição de ministro de Estado da Justiça, mas como ministro do seu governo e na condição de ministro de Estado da Defesa, afirmo, com absoluta tranqüilidade, que estamos num processo efetivo de conciliação. E que as Forças Armadas brasileiras recebem este ato como um ato absolutamente natural. Não haverá indivíduo que possa a isso reagir e, se houver, terá resposta - disse Jobim. - Todos nós, fardados ou não, temos um compromisso com o povo brasileiro e a História do Brasil.

Lula defendeu o direito dos familiares de desaparecidos de enterrarem seus mortos:

- Uma das feridas que permanece aberta é a da localização dos restos mortais de muitos dos opositores mortos. Os seus familiares e amigos, seguindo uma tradição milenar, reclamam o justo direito sagrado de sepultar seus entes queridos. Esse direito milenar e sagrado é de todos, independentemente de credo religioso ou político. É esse direito que queremos resgatar sem rancor, sem revanchismo de qualquer ordem.

Um dos discursos mais contundentes foi do presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos, Marcos Antônio Barbosa, que defendeu punição para os militares que praticaram atos de tortura e outros crimes durante a ditadura e afirmou que buscar a Justiça não é ser revanchista.

- A tortura é crime imprescritível. É inadmissível que seja esquecida. Essa luta não terminou. Os arquivos não foram totalmente abertos, e os corpos não foram encontrados.

O ministro da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, disse, após o evento, que os três comandantes militares foram convidados. Com o intuito de demonstrar que hoje há uma boa relação entre civis e militares no governo, Vannuchi afirmou, em discurso, que a Força Aérea Brasileira (FAB) contribui, com seus aviões, nas ações e missões em defesa dos direitos humanos no país. Ele isentou os atuais oficiais de qualquer envolvimento nas ações da ditadura.

O presidente disse, em entrevista, que novos documentos serão enviados ao Arquivo Nacional:

- Nós queremos contribuir e trabalhar para que a sociedade brasileira feche a página desta história, vire a página de uma vez por todas e que a gente possa construir um futuro com muito mais solidariedade, mais irmanados, a sociedade trabalhando junto, esquecendo um pouco o que foi o regime autoritário. Acho que há disposição para isso. Acho que há vontade dos militares, da polícia. O que nós vamos fazer é aquilo que temos condições de fazer.