Título: Dirceu diz que decisão do STF está sob suspeição
Autor: Barbosa, Adauri Antunes
Fonte: O Globo, 31/08/2007, O País, p. 5

MENSALEIROS NO TRIBUNAL: "Estou perplexo, estupefato e quase em pânico. Isso é impensável em qualquer país"

Para deputado cassado, ministros do Supremo sofreram pressão da mídia para aceitar denúncia contra os 40 acusados

SÃO PAULO. O ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu (PT-SP) disse ontem que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela aceitação da denúncia contra os 40 acusados de envolvimento com o mensalão está sob suspeição. Para ele, os ministros do STF teriam se sentido pressionados pela mídia ao votar.

- O julgamento, no mínimo, está sob suspeição. Quem me dá garantia de que vou ser julgado, daqui a dois anos, absolutamente na forma da lei e da Constituição? Em outro país, o julgamento seria suspenso - disse Dirceu, que deu ontem a primeira entrevista após o STF ter aceitado a denúncia contra ele por formação de quadrilha e corrupção ativa. A Corte aceitou a denúncia de que Dirceu teria sido o chefe da "organização criminosa" do mensalão.

O deputado cassado citou tanto o fato de O GLOBO ter divulgado e-mails de ministros do STF discutindo votos, no primeiro dia do julgamento, como de a "Folha de S.Paulo" ter publicado, ontem, o relato de conversa telefônica na qual o ministro Ricardo Lewandowski teria afirmado que no Supremo "todo mundo votou com a faca no pescoço" e que a tendência era "amaciar para o Dirceu". Lewandowski foi o único que votou contra a aceitação da denúncia contra Dirceu por formação de quadrilha.

- Estou perplexo, estupefato e quase em pânico. Isso é impensável em qualquer país - disse Dirceu, afirmando temer pelo seu futuro e pela influência da mídia sobre as decisões do Judiciário.

Ex-ministro defende revisão de concessões da mídia

O e-ministro criticou o que considera influência da mídia:

- Estamos caminhando para a ditadura da mídia no país. Houve intervenção brutal no julgamento - disse, defendendo a revisão das concessões de TVs e de rádios, a regulação do setor e a concorrência. - Que pena que não tem outra mídia para também tomar partido.

Dirceu comparou o tratamento dado pela mídia a políticos tucanos também envolvidos em denúncias "talvez mais graves do que essa (do mensalão)".

- Minas Gerais arquivou hoje (ontem) a segunda CPI. A CPI dos 25 mortos na cadeia. Não se faz nada, não se fala nada. E aqui em São Paulo não tem CPI para nada! É preciso acabar com a hipocrisia no país.

O ex-ministro voltou a dizer que é inocente das acusações. Disse que leu e releu os votos do ministros e não encontrou "nenhuma prova" contra ele. Pela quinta vez, afirmou, está sendo "prejulgado" pela sociedade.

- Não roubei, não deixei roubar e nem cometi nenhuma irregularidade - reiterou.

Mais uma vez Dirceu, homem forte no primeiro mandato do presidente Lula, afirmou que está de "consciência tranqüila", o que o faz acreditar que será absolvido. Lembrou que aceitação da denúncia não é a decisão final. Em sua defesa, lembrou que já sofreu "uma devassa" fiscal e contábil que durou 17 meses.

- A Receita Federal, inclusive, já me entregou um atestado de honestidade em abril deste ano - afirmou.

Um dos motivos de ser acusado de chefiar a "quadrilha" do mensalão, disse, está ligado ao fato de ter poder político.

- Tenho 40 anos de vida pública e, agora, virei chefe de quadrilha. Pelo fato de ter poder político, eu sou o responsável, porque indícios e provas não têm. Uma funcionária da Casa Civil dizer que eu recebia parlamentares não é sinal de que comandava o esquema. É ridículo.

Dirceu afirmou que não quer e nem pleiteia o apoio do PT e do governo no processo.

O advogado do ex-ministro, José Luís Oliveira Lima, que esteve ao seu lado durante toda a entrevista, disse que "no momento adequado" a reportagem sobre o teor da conversa telefônica de Lewandowski poderá ser anexada à defesa.