Título: Expostos à tentação
Autor: Oliveto, Paloma
Fonte: Correio Braziliense, 13/04/2009, Brasil, p. 7

Pesquisa do Datafolha entre jovens de seis capitais mostra que maços de cigarro à vista em postos de venda são grande chamariz para o consumo precoce da droga. ONG quer comercialização ¿escondida¿ Fagner, 20 anos: fumante desde os 13, sabe que o produto é prejudicial à saúde, mas não liga As propagandas foram banidas da mídia, as embalagens trazem imagens horripilantes e a pressão contra o tabaco é cada vez maior, mas, ainda assim, os jovens sentem-se atraídos pelas carteiras de cigarro. Embora pesquisa recente do Ministério da Saúde tenha mostrado que o número de brasileiros entre 18 e 24 anos que fumam caiu 50% nos últimos 20 anos, a exposição dos maços em postos de venda são um chamariz à primeira tragada. É o que dizem os próprios adolescentes, ouvidos pelo Datafolha, a pedido da Aliança de Controle do Tabagismo.

Para 71% dos entrevistados de 12 a 22 anos, a exposição de cigarros pode influenciar no hábito de fumar. A pesquisa ouviu 560 jovens de ambos os sexos em seis capitais: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Brasília. Na capital da República, 52% citaram o cigarro quando perguntados sobre o produto que mais lembram de ver à venda em postos de gasolina, lojas de conveniência, supermercados, padarias, bares, bancas de jornais e camelôs ¿ no país, 55%.

O resultado já era esperado pela vice-presidente da ACT, Mônica Andreis. Ela conta que a ideia da ONG era verificar se os jovens brasileiros tinham a mesma percepção dos canadenses, que já responderam a uma pesquisa parecida e, hoje, segundo a legislação, não são mais expostos às embalagens de cigarro. Lá, o produto é vendido em prateleiras discretas, longe dos olhos dos consumidores. ¿Aqui, apesar de a propaganda ser proibida e de as embalagens exibirem aquelas imagens, tem toda a exploração do outro lado dos maços. São atraentes, coloridos. Alguns pontos de venda chegam a fazer a decoração com as cores e o design semelhante ao das embalagens¿, diz. Ela cita a cafeteria de uma das maiores livrarias de São Paulo, que copia o desenho de uma marca de cigarros.

A chefe da divisão de controle do tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Tânia Cavalcanti, lembra que a indústria também investe pesado em promoções voltadas aos jovens, embora a venda de cigarros a menores de 18 anos seja proibida no país. ¿A venda casada do cigarro com produtos altamente apelativos, como headphones e mochilas, é um exemplo disso¿, diz. Segundo o Inca, 90% dos fumantes começaram antes dos 19 anos.

Velha estratégia A estratégia de tentar atrair jovens não vem de hoje. Devido a uma série de ações judiciais contra grandes empresas nos Estados Unidos, os arquivos secretos das transnacionais vieram à tona e revelaram o principal foco de vendas. ¿Eles representam o negócio de cigarros amanhã. À medida que o grupo etário de 14 a 24 anos amadurece, ele se tornará a parte chave do volume total de cigarros, no mínimo pelos próximos 25 anos¿, afirmou, num documento, J.W.Hind, da R.J. Reynolds Tobacco, a segunda maior indústria de cigarros dos EUA.

Em sua página na internet, a Philip Morris garante que não quer atrair os jovens. ¿Nós nos concentramos no trabalho com governos e varejistas para impedir que menores comprem cigarros. Defendemos o estabelecimento de limites de idade e insistimos na necessidade de que os governos os façam ser cumpridos com rigor¿, defende-se.

A estratégia não adianta muito. Fagner Lima de Souza, 20 anos, começou aos 13, ¿roubando¿ o cigarro do pai, agora ex-fumante. Ele acha que as campanhas voltadas aos jovens adiantam pouco. ¿Eu sei que é prejudicial, mas fumo assim mesmo. Meus amigos também.¿ Para Fagner, as fotografias que estampam as carteiras não são um desestímulo. ¿Nem olho aquilo ali¿, confessa. Já a imagem de um cigarro no posto de venda é um atrativo. ¿Até de ver em filme já dá vontade.¿