Título: Momento é de pacificação
Autor:
Fonte: O Globo, 03/09/2007, O País, p. 5

BRASÍLIA. Representante das Forças Armadas na Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, o coronel da reserva João Batista Fagundes admite que a cerimônia do lançamento do livro "Direito à memória e à verdade", no Palácio do Planalto, gerou inconformismo nos três comandos, em especial no Exército.

Evandro Éboli

O que mais incomodou os militares, o conteúdo do livro, os discursos das autoridades, a presença de ex-perseguidos políticos?

CORONEL JOÃO FAGUNDES: De fato, todo o episódio gerou inconformismo nos setores militares. Diria que de tudo um pouco incomodou. Ainda hoje é difícil entender que as tropas militares, à época, receberam uma ordem e a cumpriram fielmente. O militar não analisa ordem. Recebe-a como uma missão. Não podem ser apontados como matadores.

O presidente da comissão, Marco Antônio Barbosa, disse que o crime de tortura é imprescritível. O que o senhor achou?

CORONEL FAGUNDES: Não se pode começar a fazer uma caça às bruxas neste momento, que é de pacificação. Não nego a violência que existiu naquela época. Mas a anistia, além de excluir o crime político, extingue a punibilidade. Pressupõe completo esquecimento.

O Alto Comando do Exército reagiu ao livro, que narra casos de tortura, dizendo que "fatos históricos têm diferentes interpretações". O senhor concorda?

CORONEL FAGUNDES: Evidentemente que concordo. Não se pode ter o enfoque apenas do lado dos guerrilheiros, que prevalece. No livro, constam duras verdades do passado, mas que devem servir de ensinamento ao Brasil do presente e permanecer no escaninho da História, sob o pálio protetor de uma anistia política que foi ampla, geral e irrestrita. Deve ser tratado como um livro de história, como o que trata da Inconfidência Mineira, de Tiradentes ou da escravatura.

A nota do Alto Comando diz que não há dois Exércitos, numa referência ao discurso do ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), que disse que os militares de hoje não tem nada a ver com os do período da ditadura.

CORONEL FAGUNDES: O Exército é um só, mas as épocas são diferentes. Aquele era um período de exceção e hoje se vive a plenitude da democracia e da independência dos Poderes. Olha a decisão do STF sobre o mensalão! Disseram que muitos seriam absolvidos.