Título: Fôlego renovado
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 13/04/2009, Economia, p. 10

O governo está confiante que a recuperação do consignado será forte o suficiente para sustentar parte do consumo das famílias.

Depois de oito meses em queda, o crédito consignado voltou a ganhar força neste ano. Dois motivos explicam a retomada das liberações: a queda da taxa básica de juros (Selic), de 13,75% para 11,25% ao ano, e a decisão do governo de ampliar de 20% para 30% o limite de comprometimento da renda de aposentados com os empréstimos. Ao longo de 2008, os bancos foram obrigados a reduzir à metade as operações com o consignado. Primeiro, porque o governo tentou segurar o consumo diminuindo a parcela consignável. Segundo, como aposentados e servidores podem pagar, no máximo, juros de 2,5% ao mês, as margens de lucro dos bancos caíram muito, pois o custo de captação disparou por causa da inflação, que elevou a Selic, e da crise mundial.

Enquanto o crédito total deve crescer 14% neste ano, pelas contas do Banco Central, a previsão para o consignado é de expansão de 26%, diz a economista Luíza Rodrigues, do Banco Santander. E, mais uma vez, a demanda pelos empréstimos será puxada pelos servidores públicos, que estão com os salários garantidos nestes tempos nebulosos, em que o desemprego voltou a bater nas portas de muitas famílias. Para se ter uma ideia da recuperação do consignado, as concessões acumuladas em fevereiro, de R$ 3,907 bilhões, deram um salto de 37,7% sobre dezembro, quando tais operações atingiram o fundo do poço (R$ 2,837 bilhões). Isso, com os juros em baixa: de 30,8% para 29,3% ao ano.

A contragosto O governo está confiante que a recuperação do consignado será forte o suficiente para sustentar parte do consumo das famílias, vital para o bom desempenho da economia neste ano. A determinação do presidente Lula é de que os bancos públicos ¿ principalmente o Banco do Brasil, agora sob nova direção ¿ liderem esse processo, apesar de os dirigentes dessas instituições não verem o consignado com bons olhos, mesmo sendo operações de baixíssimo risco. Na visão do BB e da Caixa, os empréstimos com desconto em folha não agregam clientes aos bancos. Os tomadores pegam o dinheiro e só voltam se precisarem renovar os financiamentos. Não absorvem outros produtos mais rentáveis para as instituições.

O consignado será puxado ainda, na avaliação do BC, pelos bancos pequenos e de médio portes, que, depois de cinco meses de extrema secura, voltaram a captar recursos no mercado por meio da emissão de recibos de depósitos bancários (RDBs), papéis que garantem a cobertura das aplicações em até R$ 20 milhões no caso de quebra das instituições. O Banco BMG, um dos principais atores desse segmento do mercado, viu os seus empréstimos aumentarem 41% no primeiro trimestre sobre igual período do ano passado. Em 2008, o crédito com desconto em folha oferecido pelo BMG havia avançado 20%.

Volta dos pastinhas Com as operações mais ativas, os bancos voltaram a contratar os tais ¿pastinhas¿, agentes independentes que captam clientes para as instituições e ficam com uma parcela dos juros. As condições, agora, são outras. Em vez de até 25% dos ganhos com os empréstimos, os bancos estão pagando 10%. Mas para quem está desempregado ¿ os ¿pastinhas¿ foram as primeiras vítimas da crise ¿, qualquer real faz a diferença.

Para os bancos, especialmente os pequenos, que não têm rede de agências, esses intermediadores de crédito são fundamentais, pois vão atrás dos potenciais tomadores, fuçando prefeituras e órgãos públicos. O problema é que boa parte deles não tem ética nenhuma. Aproveitam-se da boa fé e do desconhecimento de muita gente, sobretudo de aposentados e pensionistas do INSS, oferecendo um monte de benefícios quando, na verdade, estão empurrando dívidas pesadas, que comprometem a renda por um longo período, reduzindo o poder de compra de muitas famílias.