Título: CNA e agricultores brigam por R$80 milhões
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 02/09/2007, O País, p. 17

Confederação Nacional de Agricultura processa trabalhadores rurais por uma fatia da contribuição sindical.

BRASÍLIA. Rivais nas questões agrárias, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) vêm travando, discretamente, uma disputa milionária. As duas entidades brigam por uma fatia de quase R$80 milhões arrecadados da contribuição sindical do agricultor familiar do país. A CNA quer passar a receber esse dinheiro de pequenos agricultores e até já recorreu à Justiça contra milhares deles.

A iniciativa gerou um fato inusitado: a entidade patronal processa até assentado vinculado ao arquiinimigo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) sob a alegação de que donos de áreas devem recolher contribuição à CNA.

A briga entre as duas entidades envolve o conceito do que é empresário do campo - o fazendeiro - e o que é trabalhador rural, para fins de enquadramento sindical. Pela lei, um decreto de 1971, quem é dono de uma área superior a dois módulos rurais é considerado empresário. Quem tem menos é trabalhador. O tamanho de um módulo rural difere por estado e varia entre 15 hectares até 120 hectares, dependendo da região. Um hectare corresponde ao tamanho de um campo de futebol.

Agricultores dizem que lei está ultrapassada

A contribuição sindical do pequeno produtor que é considerado trabalhador é paga à Contag. Aquele que é enquadrado como empresário paga para a CNA. Mas parlamentares, entidades ligadas aos trabalhadores rurais e produtores pequenos argumentam que a lei está defasada e defendem que deva ser considerado empresário quem é dono de terra acima de quatro módulos.

Um projeto de autoria do deputado Assis Couto (PT-PR) prevê essa ampliação, mas enfrenta duríssima resistência da bancada ruralista na Comissão de Agricultura.

- Sem chances de essa proposta ser aprovada. É dono de terra? Por lei, tem que contribuir com a CNA - disse o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO).

Por outro lado, o deputado Dagoberto Nogueira (PDT-MS) fez uma veemente crítica aos ruralistas. Ele defende os pequenos agricultores.

- Os ruralistas pedem a nossa ajuda para que tenham suas milionárias dívidas anistiadas, mas não agem da mesma maneira com os pequenos, os levam para a Justiça e cobram até o último centavo. Eles têm dois discursos - disse Dagoberto.

A CNA estima que, se a proposta de ampliar de dois para quatro módulos o enquadramento sindical for aprovada, a entidade perderá 57% de seus contribuintes, que cairiam de 815.470 para 348.691 agricultores. A contribuição é assim distribuída: 80% para o sistema patronal, em que se incluem CNA, federações e sindicatos; e 20% para o Ministério do Trabalho.

A contribuição sindical é paga uma vez por ano e é obrigatória, mesmo que o agricultor não seja sindicalizado. O valor pago à CNA hoje é, em média, de R$207. Quem prefere aderir ao sistema da Contag paga em torno de R$70. O agricultor familiar que tem ao menos um empregado contratado formalmente também paga a contribuição, independentemente do tamanho de sua terra.