Título: Aos pés de Lula
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 04/09/2007, O Globo, p. 2

Aqui fora, o que mais ecoou do congresso do PT foi o indevido pedido de apoio aos réus no STF, feito pelo presidente Lula, e a ambígua defesa da candidatura própria em 2010. Mas o encontro explicitou ainda uma ascendência maior de Lula sobre o partido, e, para dentro, o fim da era Dirceu, uma fricção menor entre as tendências, além da eterna dificuldade do PT para assumir-se como partido no poder. Só isso explica a aprovação de teses como a da desprivatização da Companhia Vale do Rio Doce, que o governo deplora.

O presidente da República não é um militante, suas responsabilidades e compromissos vão muito além de seu partido. Presidente não fala para público interno, fala sempre para todos. Por isso, Lula atravessou ao defender o apoio aos petistas que serão agora processados pelo STF. Em seu improviso, dizia-se ontem no partido, ele defendeu a solidariedade pessoal, nem bancou a inocência de ninguém. De fato, disse que nenhum foi ainda inocentado ou culpado. Mas avançou ao pedir que não tenham vergonha de defender companheiros. E, com isso, foi contra a corrente produzida pelo julgamento do STF, de rigor e intransigência com delitos de políticos.

Afora isso, o que se viu no congresso foi um PT ainda fragilizado pelo baque de 2005, mais sujeito à liderança de Lula, aceitando, por exemplo, a ressalva de que a candidatura própria em 2010 seria construída com os aliados. Não foi uma admissão de que pode ceder a cabeça de chapa, mas não também uma declaração unilateral que desagradaria os aliados. Não houve críticas à política econômica nem chiadeira pelo avanço dos outros partidos sobre cargos do governo, hoje negociados pelo ministro petebista Mares Guia.

- Eu diria que este congresso foi uma transição entre o partido do passado e o novo, que ainda está surgindo - diz o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel.

É novidade o fim da hegemonia do antigo Campo Majoritário de Dirceu, mas saiu perdendo também o ministro Tarso Genro. A ala sob sua liderança não chegou a fazer os esperados 20% dos delegados. Ele ainda paga por ter sugerido um ajuste de contas interno em 2005.

O ranço oposicionista apareceu na aprovação de teses como a reestatização da Vale, a da supressão do Senado e a da Constituinte exclusiva. Esta última é idéia defensável, pregada pela OAB, mas, se desacompanhada da ressalva de que só viria depois de 2010, serve à exploração da idéia já negada do terceiro mandato. Avanço foi o compromisso com a legalização do aborto, tema que o PT sempre tangenciou.

Em seu discurso, afora os improvisos que ecoaram, Lula desfiou números econômicos e sociais de seu governo. "Ele indicou avanços em matéria de política econômica, de inclusão social e retomada da ação do Estado brasileiro. Devíamos nos ocupar mais destas questões. Elas é que permitirão ao PT e aos aliados apresentar uma candidatura forte em 2010", diz o petista Luiz Favre.

Marcelo Déda, governador de Sergipe, acha que o congresso poderia ter avançado mais na discussão da trajetória do partido. "Os acertos são maiores, mas os erros são importantes", diz ele, desgostoso com a velha estrutura de tendências, que, a seu ver, amarram o debate interno.