Título: Governo vai favorecer importação de trigo
Autor: Batista, Henrique Gomes e Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 04/09/2007, Economia, p. 24

Objetivo é conter aumento de preços. Fazenda monitora leite, carne e grãos "para que não haja abuso", diz Mantega.

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, enviou à Câmara de Comércio Exterior (Camex) uma proposta para reduzir a alíquota de importação do trigo, cujo custo está em alta. Essa seria uma forma de conter a elevação dos preços, que começam a ter impacto nos índices de inflação. Mantega também informou que a equipe econômica passou a acompanhar a evolução do preço de "meia dúzia" de produtos - lácteos, carnes e alguns grãos - que estão em processo contínuo de reajuste e não descartou a redução de outras tarifas de importação:

- Existem dois, três, meia dúzia de preços que sofreram uma elevação, e isso é normal. Estamos atentos para que não haja nenhum abuso, que nenhum setor eleve margem (de lucro). Se isso ocorrer, tomaremos medidas como redução de tarifa de importação.

Mas ele ressaltou que a análise tem de ser cautelosa, pois há casos em que essa redução pode ser ineficaz, já que grande parte dos alimentos tem cotação internacional:

- O trigo está aumentando porque é uma commodity e, no mercado internacional, seu preço está aumentando. É muito difícil não aumentar o trigo, a não ser que você use algum artificialismo, e o nosso governo não gosta de usar artificialismo.

Ministro vê pressão de demanda, mas não inflação

O Ministério do Desenvolvimento confirmou que o governo estuda reduzir, em caráter temporário, a alíquota de importação do trigo de países fora do Mercosul. Segundo a Abitrigo, que representa as indústrias do setor, o objetivo é compensar os efeitos da decisão tomada em março pela Argentina de suspender, até outubro, as exportações do trigo para garantir o abastecimento interno e evitar a alta da inflação. Atualmente, a tarifa de importação sobre o trigo é de 10%. O setor está importando de EUA e Canadá.

O secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Armando Meziat, disse ter recebido da Argentina a garantia de que não faltaria trigo no Brasil.

Mantega disse ainda que alguns produtos estão em plena entressafra, sendo o aumento normal. Apesar disso, ele afirmou que há casos de pressão de preços decorrentes do aumento da procura, fruto da expansão do emprego, da renda e da atividade econômica.

- Existe uma pressão de demanda sim, ela está bastante aquecida. A pesquisa mensal de comércio de junho acusa aumento do consumo de 13% em relação ao ano anterior. Mas sabemos que parte dela é atendida pela importação. Não noto maiores pressões inflacionárias - disse, às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que deve reduzir a magnitude de corte dos juros.

Para economista, câmbio traz mais incerteza

Para o presidente da Bolsa de Gêneros Alimentícios do Rio, José de Sousa, a pressão dos alimentos é "transitória". Ele cita o leite, que chegou a custar R$3 em padarias. No atacado, o item ficou 20% mais em conta, passando de R$2 para R$1,60 nos últimos 15 dias:

- Preços altos são esporádicos e resultado de efeitos sazonais. É o caso da carne, em entressafra. Num mês, o quilo do corte dianteiro subiu de R$2,60 para R$2,90 (11,5%); e o traseiro, de R$4,50 para R$5 (11,1%).

Para economistas, os preços de leite, carne, frango e trigo vão ceder, mas dificilmente voltarão aos valores anteriores aos choques de oferta que vêm alimentando os reajustes desde o início do ano.

- A pressão dos alimentos tende a arrefecer, mas é preciso ter em mente que as quedas não serão tão expressivas quanto as altas - disse Otávio Aidar, economista da Rosenberg & Associados.

Para André Braz, coordenador do IPC-S da FGV, a mudança no clima, agora favorável a produtos como leite, tende a baixar os preços, mas apenas em parte. Pelo IPCA, referência para o sistema de metas de inflação do governo, o leite longa vida acumula alta de 44,64% de janeiro a julho. Na área de grãos, como soja, milho e trigo, as cotações seguem elevadas devido aos problemas com a oferta mundial. A volatilidade do câmbio, disse Aidar, traz ainda mais incerteza. Para Márcio Nakani, coordenador do IPC da Fipe, os alimentos continuarão pressionando a inflação nos próximos três ou quatro meses.