Título: Devoradora de PIB
Autor: Pereira, Merval
Fonte: O Globo, 07/09/2007, O País, p. 4

Na discussão sobre a continuidade ou não da CPMF, o presidente Lula ontem colocou sua aprovação como fundamental "para que a gente possa fazer mais política de transferência de renda, mais política de educação, mais política de saúde, para que a gente possa ver o país crescer". Posta desta maneira, a manutenção da CPMF e, por conseguinte, da atual carga tributária brasileira recorde está associada não apenas às políticas assistencialistas atuais, como também ao desenvolvimento do país. Mas e se a carga tributária, que é de 35% do PIB pelos novos critérios do IBGE, de longe a maior da América Latina e uma das maiores do mundo, for justamente a responsável pela falta de crescimento de nossa economia e pela perda de produtividade do país?

Segundo o Banco Mundial, 39,2% do nosso PIB estão na informalidade. Pelas contas do economista Marcelo Néri, da Fundação Getulio Vargas, se todos pagassem os impostos que devem ao Estado, a carga tributária hoje seria de inacreditáveis 57% do PIB.

O Brasil tem uma carga tributária incompatível com seu grau de desenvolvimento, que o economista Delfim Netto classifica de "Ingana": taxação de Inglaterra e serviços de Gana.

O peso dos tributos é alto mesmo quando comparamos o Brasil com economias desenvolvidas, sendo maior, por exemplo, que a carga tributária japonesa (26,5%), a suíça (30%) e a canadense (33,5%).

Pois o economista Paulo Rabelo de Castro, presidente do Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomércio/SP e vice-presidente executivo do Instituto Atlântico, considera o dilema entre "não taxar" ou "não investir no social" "equivocado e falacioso".

Ao contrário, demonstra, através de estudos e projeções, que a carga tributária virou "uma devoradora de PIB". Cada ponto percentual sobre o PIB de elevação da carga nos devora 0,3% de crescimento "para sempre", acentua.

Para ele, "a carga tributária de hoje contrata a perda de PIB amanhã". Ele diz que a elevação contínua da carga de tributos, "à base de 1 ponto percentual adicional de PIB por ano", provoca a redução permanente da taxa de crescimento do PIB.

Segundo cálculos da RC Consultores, apresentados na comissão que discute a CPMF, o aumento permanente da carga tributária, que acontece há mais de dez anos, torna maior ainda o peso dos tributos, pois "esta carga "adicional", ou "incremental", tem sido de, pelo menos, o dobro da carga média. O governo se apropria de mais de dois terços de todo o esforço de crescimento do país".

"Prorrogar a CPMF é prorrogar a improdutividade", enfatiza o economista. Mesmo com sua extinção, que ele defende, os estudos de Rabello de Castro mostram que "cada real de redução na carga conseguiria fazer retornar essa renúncia fiscal imediata em apenas seis anos, em termos de elevação permanente do crescimento nacional".

A partir do sexto ano, ressalta Rabello de Castro, toda a arrecadação extra ultrapassaria o total dos R$35 bilhões renunciados hoje: "A conclusão é inequívoca: com o atual nível de carga, o melhor negócio do país, em termos de investimento público, é cortar tributos, especialmente os mais danosos ao processo produtivo, como a CPMF".

O pior negócio do país, e o mais tolo do ponto de vista da boa técnica de planejamento econômico, diz Rabello de Castro, é insistir que a carga tributária atual é irrenunciável "porque o país precisa crescer".

Ele diz que reduzir a carga tributária, "mais do que qualquer outro investimento, é a forma mais rápida e mais segura de se aumentar a taxa de crescimento do país". Pelo mesmo raciocínio, "após a elevação de carga tributária em 5 pontos, o PIB total é "engolido" em R$33 bilhões todos os anos, ou seja, perde-se riqueza igual a uma arrecadação de CPMF".

Contrapondo-se à idéia de que a carga tributária, mantida a CPMF, ajudaria a transferir renda para os mais necessitados através dos programas assistencialistas, Rabello de Castro garante que ela "só contrata mais estagnação e miséria".

Segundo ele, "o efeito mais danoso é o indireto, por matar empregos e a produtividade geral da economia. A associação entre o gigantismo da carga tributária, ligada ao Estado assistencialista, e o resultado da estagnação da renda per capita nas últimas duas décadas salta aos olhos pelas estatísticas econômicas do comportamento da produtividade nos últimos anos".

De fato, estudo divulgado esta semana em Genebra pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostra que houve, de 1980 até 2005, um recuo da produtividade do trabalho no Brasil. O índice de produtividade do trabalhador brasileiro não apenas caiu, mas regrediu, ficando abaixo dos níveis de 1980.

Paulo Rabello de Castro ressalta que, na mesma pesquisa, está registrado que a China, cujo trabalhador tinha apenas 5% da produtividade do americano, saltou para 12%. E a do coreano passou de 28% para 68%, o que ele classifica de "um sucesso escandaloso".

Segundo esse estudo, o Brasil hoje é superado por países tão distintos quanto Argentina, Chile, Bósnia e Irã, e passou a ter taxas equivalentes às de Uganda.