Título: Inflação dobra e atinge em cheio os mais pobres
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 07/09/2007, Economia, p. 21

SOB PRESSÃO

INPC, que mede variação de preços dos que ganham até 6 mínimos, subiu para 0,59%. IPCA, na faixa até 40 mínimos, foi de 0,47%.

Mais inflação para quem ganha menos. A disparada nos preços dos alimentos atingiu em cheio o orçamento das famílias com renda até seis salários mínimos. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede as oscilações de preços desse grupo, subiu para 0,59% em agosto, bem acima dos 0,32% de julho, e já acumula alta de 3,13% no ano e de 4,82% em 12 meses, conforme divulgou ontem o IBGE. Já o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), para os que têm renda até 40 mínimos, subiu para 0,47%, quase o dobro do registrado no mês anterior (0,24%). No ano, o IPCA, que serve de referência para o sistema de metas de inflação do governo, está em 2,80% e, nos últimos 12 meses, 4,18%, muito perto da meta de 4,5% fixada para 2007.

- Os alimentos, que pesam mais na cesta de quem ganha menos, vêm subindo muito. Já os itens que estão em baixa, como telefonia e combustíveis, têm presença menor no orçamento dessas famílias. Assim, a taxa tem subido mais, prejudicando as faixas de renda mais baixas - explicou Eulina Nunes, coordenadora do Sistema de Índice de Preços do IBGE.

É a primeira vez, desde 2003, que o INPC supera o IPCA. Até então, a inflação era mais favorável a quem tem renda menor, pois a alimentação vinha funcionando como uma espécie de âncora verde dos preços. Em agosto, a participação dos alimentos na alta média dos preços foi expressiva. Do 0,47% do IPCA, 62% vieram do grupo Alimentação e Bebidas. Só leite e derivados contribuíram com 27%.

- Os números estão bem acima do que se falava há três meses. Houve alta fortíssima basicamente em cinco produtos: carne, leite, soja, milho e trigo. Não é meramente um problema de entressafra, houve mudança estrutural dos preços agrícolas. Eles deixaram de ser âncora e devem subir 9% este ano. Aumentou o consumo de proteína no mundo, por causa da urbanização na China e da Índia e até no Brasil, graças a Deus, com o aumento da renda - disse Luiz Roberto Cunha, especialista em inflação e professor da PUC.

Assistente de cobrança, Edmar Condé mudou seus hábitos para conseguir adequar a renda da família à nova realidade de preços. Os laticínios, por exemplo, passaram a freqüentar menos a geladeira dela.

- Lá em casa tinha queijo toda semana. Mas, depois do aumento nos preços, só compro uma vez ou outra, quando tem oferta, e da marca que estiver mais barata.

Tarifas de energia puxam índices para baixo

Decisão semelhante tomou a professora Adriana Monteiro.

- Eu deixei de comprar a marca de iogurte a que estava acostumada. Agora, pesquiso antes e escolho o produto que tenha as mesmas características, mas de preço menor.

Assim, tenta-se driblar a carestia.

Segundo Eulina, do IBGE, o IPCA de julho teve o efeito benéfico da redução de cerca de 13% nas tarifas de energia em São Paulo.

- Isso não deixou transparecer a alta dos alimentos. Enquanto, no fim de 2006, os preços da alimentação acumularam alta de 1,23%, neste ano, até agosto, a alta já está próxima de 7%. Chuvas, entressafra e demanda interna e externa em alta foram os culpados pela subida.

Os preços administrados, aqueles controlados pelo governo, como as tarifas de energia, telefonia, estão ajudando a segurar a inflação. Papel oposto ao que tradicionalmente tinham até o ano passado. Em julho, houve queda de 0,22% e, em agosto, a elevação se limitou em 0,12%. Foi longe o tempo em que essas taxas eram sempre de dois digitos. Padrão que perdurou de 1999 a 2004. Em 2005, ela ficou em 9%. apenas um dígito, mas bem acima da inflação.

- Nos últimos 12 meses, a taxa está em 2,37%, abaixo da inflação. E, este mês, a tarifa de telefone já tem queda de 1%, com a mudança de pulso para minutos - explicou Elson Teles, economista-chefe da Concórdia Corretora.

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