Título: O próprio Congresso dá nota baixa ao Congresso
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 09/09/2007, O País, p. 3

AUTOCRÍTICA NO PARLAMENTO

Enquete com 59 dos cem parlamentares mais influentes aponta caso Renan e submissão ao Executivo como maiores fontes de desgaste.

Desgastado diante da opinião pública por sucessivos escândalos de corrupção e pela complacência com a impunidade, o Congresso Nacional é reprovado por sua própria elite. Enquete feita pelo GLOBO com 59 parlamentares da lista dos cem mais influentes mostra que deputados e senadores reconhecem que o desempenho da atual legislatura, que começou em fevereiro disposta a melhorar sua imagem, está longe de atender aos anseios da sociedade. Na média das notas conferidas, o Parlamento obteve apenas nota 5,4, numa escala de zero a 10. Entre os pontos negativos, os entrevistados apontaram a submissão à agenda do Executivo e as denúncias contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Considerando-se apenas as notas dadas pelos 46 deputados ouvidos, que este ano estão vendo a crise política de camarote, a avaliação continua baixa: 5,6. Mas apenas sete deles deram nota abaixo de 5. Já os 13 senadores ouvidos foram mais rigorosos. Traumatizados pelo processo envolvendo o presidente da Casa, que se arrasta há mais de cem dias, os senadores atribuíram em média nota 4,75 para a legislatura.

Chinaglia e José Múcio dão nota 8

Muitos citaram o caso Renan como o maior responsável, este ano, pela corrosão da imagem do Parlamento. Mas poucos quiseram fazer declarações públicas nesse sentido.

- O Congresso conseguirá se auto-afirmar se considerar o sentimento de identificação com a sociedade e, mesmo com o voto secreto, aprovar a perda de mandato (de Renan) no plenário - afirmou o líder do DEM no Senado, Agripino Maia (DEM-RN), que deu nota 6.

O GLOBO considerou como universo da enquete os cem listados como "Cabeças do Congresso" pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Entre os 46 deputados ouvidos, as duas melhores notas foram dadas pelo presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e pelo líder do governo, José Múcio Monteiro (PTB-PE): nota 8. Ambos, contudo, apesar de a avaliação pedida referir-se às duas Casas, preferiram avaliar apenas a Câmara.

Chinaglia e Múcio destacaram, entre os projetos aprovados, na análise dos aspectos positivos, as medidas do Plano de Crescimento Econômico (PAC), apontadas pela maioria dos entrevistados. Chinaglia citou ainda, como ponto positivo, a retomada do ritmo de votações, a presença maciça nas sessões e a economia de R$8 milhões no semestre passado com o corte de passagens, diárias e horas extras.

Como ponto negativo, o presidente da Câmara, que encabeça a lista dos cem mais influentes, citou um problema apontado pela maioria dos consultados: o excesso de medidas provisórias enviadas pelo Executivo, que atravanca a pauta de votações das duas Casas. Reclamação feita, de forma indistinta, por oposicionistas e governistas. A piores notas da enquete foram dadas por parlamentares de oposição. Na Câmara, Fernando Gabeira (PV-RJ) deu nota 2 ao desempenho da Casa. E disse que a única vantagem desta legislatura era o fato de o Congresso existir:

- Mesmo com todos os defeitos e a mediocridade dos debates - disse Gabeira.

No Senado, o desapontamento maior vem do ex-governador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), que retorna à Casa depois de 20 anos:

- Nota próxima de zero. De positivo, apenas o pacote de segurança que votamos no Senado. Até agora é uma legislatura de acontecimentos frustrantes e negativos.

A líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC), tinha na ponta da língua matérias importantes votadas pela Casa, apesar da crise Renan. Por isso, deu nota 7. O colega Aloizio Mercadante (PT-SP) concorda e lista outros projetos, entre eles o da inclusão digital nas escolas públicas, mas não quis dar nota. Somou-se a vários outros ao lamentar o fracasso da reforma política:

- Ela (a reforma) é imprescindível ao país e ajuda a prevenir as crises recorrentes.

Mesmo reconhecendo a frustração por não votar a reforma política, muitos deputados listaram o debate aprofundado que a tentativa de votá-la proporcionou:

- A Casa enfrentou o debate da reforma política - disse o presidente do PMDB, Michel Temer (SP), que também não quis dar nota.

Falta de bate profundo é condenada

A falta de debates foi citada como uma das grandes falhas dessa legislatura. Muitos salientaram que as discussões mais aprofundadas acontecem nas comissões temáticas, mas não se revertem em prioridades do Congresso.

- Nas comissões há de fato debate, mas os projetos não chegam à pauta. Há a ditadura dos líderes - reclamou Luiza Erundina (PSB-SP), que deu nota 5 à Legislatura.

Muitos justificaram a baixa nota pelo fato de a legislatura patinar em problemas que surgem a cada dia. Praticamente todos admitem que há falta de sintonia com a sociedade. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), por exemplo, propõe que o Senado fique, por dois meses, só discutindo soluções para educação e saúde. O líder do DEM na Câmara, Onyx Lorenzoni (RS), que deu nota 5, sugere que por três semanas os parlamentares se dediquem às comissões temáticas e apenas uma semana do mês ao plenário:.

- Temos que trocar a falação por ação.

Os tucanos avaliaram de forma muito negativa a legislatura. No Senado, o líder Arthur Virgílio (AM), deu nota 5. O líder da Câmara, Antônio Pannunzio (SP), apenas 3, justificando:

- Essa legislatura não se destacou por nenhuma grande iniciativa a favor do Brasil.