Título: Especialistas apontam melhora nesta legislatura, apesar da crise Renan
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 09/09/2007, O País, p. 4

AUTOCRÍTICA NO PARLAMENTO: Destaque para projeto sobre fidelidade partidária.

Professor culpa sistema político-eleitoral por problemas no Parlamento.

BRASÍLIA. Se a elite do Congresso é rigorosa na auto-avaliação, teóricos amenizam as críticas e apontam uma melhora nesta nova legislatura - tendo como parâmetro a última, uma das piores legislaturas dos últimos anos. O ponto de desgaste, para eles, está concentrado no Senado, com o processo por quebra de decoro contra o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL). O coordenador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG, professor Carlos Ranulfo, diz que projetos importantes foram aprovados e culpa o sistema político-eleitoral, em maior parte, pelos problemas enfrentados pelo Parlamento.

Para Ranulfo, há muitos comportamentos ruins na política, mas isso não é algo generalizado, nem majoritário. Na defesa dos políticos, argumenta que o Congresso é o espelho da sociedade e que as mudanças necessárias devem ser enfrentadas por todos: parlamentares, partidos, sociedade, imprensa. O professor afirma que a sociedade espera coisas contraditórias do Congresso. Ele aponta o problema do clientelismo que, na sua opinião, é o que a maioria dos eleitores espera de seus representantes.

- Votamos em pessoas que não têm poder. Eles terão uma atividade miúda, cotidiana, que gera frustração no deputado e no eleitor. Na cena eleitoral o candidato é todo-poderoso. Na cena parlamentar, não - diz Ranulfo, salientando que o sistema político obriga o deputado a trabalhar exatamente junto a suas bases, para se eleger.

Para professor, há maior comprometimento com ética

O professor da UFMG afirma que a Legislatura está apenas no início e ainda pode fazer muito. Destaca como um dos pontos importantes a votação do polêmico projeto de fidelidade partidária, muito criticado. Segundo ele, a imprensa não registrou os debates importantes que aconteceram na tentativa de votar a reforma política e destacou apenas o lado negativo do projeto de fidelidade: a anistia aos que mudaram de partido. Mas que a mudança, ainda que restrita, já é alguma coisa. Melhor do que nada.

- Podemos criticar, mas os que mudaram de partido mudaram de acordo com a regra do jogo. A fidelidade que está no projeto é um passo importante, reduzirá sensivelmente a infidelidade - diz Ranulfo.

Mesmo com o desgaste do caso Renan e a lentidão dos trabalhos, o cientista político Murilo Aragão, ex-professor da UnB, acha que esta legislatura está melhor que a passada, principalmente pelo maior comprometimento com a questão ética. A crise Renan Calheiros, avalia, está sendo enfrentada pelo Senado, que já decretou a perda do mandato do presidente da Casa no Conselho de Ética. A produção legislativa, diz Aragão, foi razoável.

Para ele, no entanto, o problema também é do sistema político-eleitoral, que, na opinião do especialista, divide-se entre os interesses do governo e do clientelismo. Em vez de fazer a reforma tributária, o Congresso vota a prorrogação da CPMF, exemplifica:

- O Congresso também não tem agenda própria e trata temas de interesse da sociedade de forma periférica, errática, cedendo a pressão corporativa de alguns grupos.

O professor cita a decisão de incluir na pauta a emenda constitucional que garante estabilidade a servidores, sem concurso público, numa espécie de trem da alegria (PEC 54 e emenda dos temporários). Para melhorar o desempenho, ele sugere a organização de uma agenda para discussão de projetos importantes e mudanças na elaboração do Orçamento da União. E propõe que, para resgatar a independência do poder, o Congresso devolva ao Executivo as medidas provisórias que não são relevantes e urgentes.