Título: Tribunais sem dinheiro
Autor: D'Elia, Mirella
Fonte: Correio Braziliense, 29/03/2009, Política, p. 7

Crise financeira mundial coloca em xeque projeto de modernização e informatização para acelerar julgamentos de 50 milhões de processos parados.

De acordo com o CNJ, R$ 22 milhões foram cortados do orçamento previsto para 2009 A crise econômica chegou ao Judiciário. E ameaça o ambicioso projeto de modernização dos tribunais brasileiros, lançado em fevereiro pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, durante o 2º Encontro Nacional do Judiciário, em Belo Horizonte (MG). A proposta prevê o julgamento, até o fim do ano, de 50 milhões de processos que estão pegando poeira em prateleiras.

Um mês depois que o chefe da mais alta Corte de Justiça do país apresentou um pacote de medidas saneadoras a juízes de todo o país, integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o próprio Gilmar, que preside o órgão, já estão atentos a possíveis reflexos na hora de tirar as propostas do papel. O problema: falta de dinheiro. Segundo o CNJ, houve um corte de R$ 22 milhões dos R$122 milhões previstos no orçamento do órgão deste ano para serem investidos na modernização de tribunais.

A conta pode subir ainda mais até junho, o que está deixando o conselho de cabelo em pé. ¿Estamos todos preocupados com a crise¿, admitiu o secretário-geral do CNJ, o juiz Alvaro Ciarlini. O corte ainda não produziu nenhum efeito concreto, mas aumenta o temor diante da expectativa do que pode vir pela frente. ¿Ainda não há motivo para alarde, mas sofremos o primeiro baque. Até junho, se houver uma frustração da expectativa de crescimento (do país), a preocupação vai ser maior ainda. Temos um planejamento estratégico¿, completou Ciarlini, sem esconder a ansiedade.

O planejamento estratégico citado pelo magistrado inclui um levantamento das necessidades de cada tribunal para os próximos cinco anos. Entre as metas, informatização e interligação dos tribunais e a automatização da distribuição de ações. O custo é alto. ¿Para dar uma arrumada na casa é preciso dinheiro¿, disse o secretário-geral. Por enquanto, o projeto ainda está na fase inicial, que prevê a abertura de licitação para a escolha de uma empresa que vai mapear os piores problemas dos tribunais. Um dos focos é a primeira instância, a mais lenta do país. O secretário-geral do CNJ avalia que o trabalho não deve ser inviabilizado mas, em caso de corte maior, admite que será preciso pisar no freio e adiar alguns projetos para o ano que vem. ¿A diminuição da capacidade de investimento vai acabar repercutindo nessas metas¿, afirmou.

Caixa-preta Pouca gente sequer sabe o que é o CNJ. Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgada durante o evento de Belo Horizonte mostrou que 76% dos entrevistados não tinham a menor ideia do que é o órgão encarregado de fazer o planejamento e o controle externo da Justiça brasileira. O levantamento revelou, ainda, que os tribunais continuam sendo uma grande caixa-preta: 36% dos ouvidos só conhecem o Judiciário de ¿ouvir falar¿. E que os cidadãos confiam mais em policiais do que em juízes. ¿É um trabalho de longo prazo para melhorar a educação. Se as pessoas não sabem nem o que é o Judiciário, como poderiam avaliar o trabalho dos juízes?¿, indagou Ciarlini.