Título: Ministros na linha de tiro
Autor: Motta, Cláudio
Fonte: O Globo, 11/09/2007, Rio, p. 12

TREM-BALA

Bandidos disparam contra composição que levava autoridades.

O trem que transportava os ministros Márcio Fortes, das Cidades, e Pedro Brito, da Secretaria Especial dos Portos, foi atacado a tiros duas vezes, ontem de manhã, por pelo menos quatro bandidos, na altura da Favela do Jacarezinho. O secretário de Transportes, Júlio Lopes, e o presidente da MRS Logística, Júlio Fontana Neto, entre outras autoridades, também faziam parte da comitiva que visitou a linha férrea, na inauguração da primeira fase do projeto de revitalização do Porto do Rio. Durante o tiroteio, os cerca de 70 passageiros, inclusive jornalistas, se jogaram no chão.

Pelo menos quatro balas e uma pedra atingiram a composição, formada por duas locomotivas e dois vagões de passageiros. Sérgio Cabral participou da inauguração da obra na sede da MRS, no Caju, mas não andou no trem. O governador deixou o terminal no Caju de helicóptero; por isto, escapou do ataque, considerado gravíssimo por Pedro Brito. O ministro afirmou que não teve tempo de sentir medo:

- Temos que usar momentos como este, gravíssimo, para que o estado torne sua presença cada vez mais forte, ocupando os espaços nas comunidades. No momento exato do tiroteio, tive uma reação de defesa e me joguei no chão.

Os ministros nunca estiveram tão próximos de um confronto armado. Márcio Fortes, no entanto, admitiu ter sido avisado da possibilidade de enfrentamento durante a inspeção:

- Eu decidi embarcar. Sou um sujeito tranqüilo, conheço exatamente o risco. Temos andado nas favelas e ruas sem segurança alguma, já estou acostumado. Sou carioca, conheço bem o Rio e continuarei visitando as comunidades.

Tiros na ida e confronto na volta

A partida do terminal no Caju ocorreu por volta das 10h30m. O trem cruzou a Linha Vermelha, as avenidas Brasil e Dom Hélder Câmara e a Linha Dois do Metrô. No trajeto, cortou o Caju e as favelas do Arará e do Jacarezinho, onde bandidos armados fizeram os primeiros disparos, no terceiro quilômetro da viagem. O maquinista aumentou a velocidade da composição enquanto passageiros se jogaram no chão. Um quilômetro depois, o trem parou, próximo aos fundos da estação Maria da Graça do Metrô. No local, decidiu-se que a composição voltaria pelo mesmo caminho, mas com o dobro da velocidade e policiais armados em algumas janelas. A PM mobilizou oito homens, alguns com fuzis, para acompanhar a inspeção.

Novamente no Jacarezinho, bandidos fizeram mais disparos e houve intenso confronto. Os passageiros voltaram a se jogar no chão, inclusive autoridades. Algumas pessoas sentiram o impacto das balas na composição. Visivelmente preocupado com o incidente, o secretário de Transportes, Júlio Lopes, conversou no trem com os ministros sobre a repercussão do caso.

- Claro que é constrangedor, difícil, não gostaria de passar por isto. O caso reflete a dura realidade que estamos vivendo. Fica patente que temos que fazer muito investimento para colocar o estado e a cidade a salvo desse tipo de ação. Os bandidos querem aparecer, talvez tenham feito isso por causa da presença da imprensa - disse Lopes.

Um funcionário da MRS disse que o trem é blindado, mas o gerente de patrimônio da empresa, Sérgio Carrato, negou. Ele disse que os carros são feitos de chapa de aço inox e vidro mais resistente para durar mais.

A inspeção tinha o objetivo de mostrar a remoção de 450 casas das margens da linha férrea num trecho de 1,5 quilômetro, entre Manguinhos e a Avenida Dom Hélder Câmara. Muros de concreto foram construídos para evitar novas invasões, num investimento de R$10 milhões. Antes da obra, pessoas moravam a apenas 30 centímetros dos trens.

Sérgio Cabral participou, no Caju, da cerimônia de inauguração, que precedeu a inspeção e chamou de populistas os governos que não contiveram a desordem urbana:

- Achar que tratar bem pobre é deixar o sujeito ocupar linhas férreas é demagogia barata que causa profundos danos à economia do estado.