Título: EUA voltam a sacudir mercados
Autor: Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 11/09/2007, Economia, p. 23

TREMOR GLOBAL

Bovespa cai 3,51% com dados de emprego e Japão.

Os mercados tiveram ontem mais um dia de queda, ainda reflexo dos dados de emprego nos Estados Unidos, divulgados na última sexta-feira, bem como da contração de 1,2% da economia japonesa no segundo trimestre, o que elevou os temores de uma desaceleração global. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que não funcionou sexta-feira, chegou a cair 4,09% ao longo do dia e fechou em baixa de 3,51%, aos 52.653 pontos. Foi a quinta maior queda do ano e a pior desde 26 de julho, quando recuou 3,76%. A Bolsa de Tóquio caiu mais de 2%, e as européias sofreram quedas de quase 1%. Em Wall Street, o índice Nasdaq recuou 0,26%, mas o Dow Jones se recuperou, depois de cair quase 1%, fechando em alta de 0,11%.

No mercado de câmbio brasileiro, o dólar sentiu o aumento da aversão a risco, mas encerrou em baixa de apenas 0,05%, a R$1,946, próximo ao fechamento. O risco-Brasil avançou 0,9%, para 214 pontos centesimais.

Corte do Fed pode não resolver

Segundo Fábio Knijnik, analista sênior do BES Investimentos, como foi feriado no Brasil na última sexta-feira, as quedas aqui foram mais fortes, devido ao temor de desaceleração da economia americana. Ele acredita que o desemprego nos EUA deve piorar nos próximos meses, já que as demissões feitas pelas instituições financeiras afetarão o índice. Um dado importante visto por investidores, explica o analista, é a taxa efetiva dos Fed funds (usada pelos bancos comerciais que depositam dinheiro no banco central americano, o Federal Reserve, Fed), que, na sexta-feira, ficou em 4,86%, contra 4,98% na véspera.

- Isso significa que, na prática, o Fed já cortou os juros, mas ainda não anunciou formalmente, o que será feito no dia 18. O BC americano vem mantendo a taxa fora do alvo para dar liquidez ao sistema - diz Knijnik.

O dia foi marcado por pronunciamentos de autoridades estaduais do Fed. A presidente de San Francisco, Janet Yellen, disse que, embora a turbulência tenha intensificado os riscos de desaceleração da economia, os responsáveis pela política monetária não devem socorrer os investidores. O de Atlanta, Dennis Lockhart, afirmou que os mercados precisam considerar tanto o dado de empregos quanto o de vendas no varejo, que foi positivo. Essas declarações reduziram as esperanças de um corte de 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Fed, em 18 de setembro, como chegou-se a especular na sexta-feira.

O conselheiro econômico da Casa Branca, Edward Lazear, afirmou ontem que os EUA não caminham para uma recessão este ano ou em 2008. Ele disse que os sinais que precedem uma recessão não estão presentes.

Ontem, a Libor (taxa interbancária usada como referência para empréstimos de longo prazo) ficou em 5,70% ao ano, contra 5,36% antes do início da crise. Para Walter Molano, sócio do banco de investimentos americano BCP Securities, as empresas estão tendo dificuldade em obter financiamento a curto prazo, por isso não têm conseguido fazer investimentos e serão obrigadas a reduzir o número de vagas.

- Hoje, o problema é de confiança - disse Molano. - Apesar de o americano precisar do crédito, vemos que, daqui para frente, o nível de percepção não é tão positivo. Eles acham que vai ter menos crédito disponível. Mesmo que o Fed reduza a taxa de juros, o problema não será resolvido.

Com a maior aversão a risco, a rentabilidade dos títulos do Tesouro americano, considerados os mais seguros do mundo, vem recuando devido à forte procura. Ontem, o papel com vencimento em dez anos, referência para o mercado, apresentou ganhos de 4,32%, com queda na rentabilidade de 1,01%. No Brasil, os contratos de juros futuros com vencimento em janeiro de 2010 tiveram alta de 0,11 ponto percentual, para 11,945% anuais.

Para Wilber Colmerauer, sócio da consultoria Liability Solutions, as perspectivas são preocupantes. Segundo ele, a percepção de risco já mudou, com parte dos investidores procurando ativos mais seguros:

- Isso pode afetar o Brasil. A nossa visão é que estamos dando os primeiros passos nesta crise do crédito.

Lula critica EUA e ganância

Em Helsinque, na Finlândia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu ontem sua visita aos países nórdicos com duras críticas aos EUA devido à crise dos mercados:

- Quem criou a lei de financiamento foi o governo americano, e quem vendeu facilidades tem de assumir dificuldades. Esses problemas vieram da ganância, de gente que comprou títulos achando que estava num cassino. Não vamos aceitar que joguem nas nossas costas os prejuízos de um jogo do qual não participamos. Se os lucros não são repartidos, não vamos querer as perdas.

Apesar da turbulência, a balança comercial brasileira abriu setembro com superávit de US$1,204 bilhão, resultado de exportações de US$3,482 bilhões e importações de US$2,278 bilhões. Já as pressões sobre os preços dos alimentos fizeram, pela quarta semana seguida, o mercado elevar a projeção de inflação para o IPCA este ano, de 3,92% para 3,99%.

COLABORARAM Fernando Duarte, correspondente, Henrique Gomes Batista e Patrícia Duarte