Título: Sessão histórica, sem registro para a História
Autor: Vasconcelos, Adriana e Lima, Maria
Fonte: O Globo, 13/09/2007, O País, p. 13

DIA D NO SENADO: Cristovam Buarque fala em crime e faz apelo: "Um dia o povo tem que saber o que aconteceu".

Não houve gravação oficial nem taquigrafia; agora, parlamentares falam em mudar o regimento do Senado.

BRASÍLIA. A sessão que julgou o presidente do Senado, a primeira da história do país a analisar um pedido de cassação de um detentor do cargo, não foi gravada nem taquigrafada. Portanto, não irá para os anais do Senado. A sessão secreta provocou protesto de diversos senadores. Cristovam Buarque (PDT-DF) chegou a falar em crime:

- Pior que a sessão secreta é o crime. Peço que essa sessão seja gravada, e a Mesa decide por quantos séculos quer guardar. Mas um dia o povo tem que saber o que aconteceu aqui.

- Não estamos escondendo nada. A única coisa que quero é preservar o devido direito legal - respondeu o vice-presidente Tião Viana (PT-AC), que presidiu a sessão.

A sessão que cassou o mandato do ex-senador Luiz Estevão, em 2000, também foi secreta e, segundo ele próprio, não há registro dos debates do julgamento no Senado.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de garantir o acesso de deputados ao julgamento de Renan Calheiros (PMDB-AL) deverá ser usada como ponto de partida para mudanças no Regimento Interno da Casa, que determina, entre outras coisas, que sejam secretas as sessões no plenário que analisam processo de cassação de mandato. Na segunda-feira, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) chegou a apresentar um projeto de resolução na tentativa de garantir que o julgamento de Renan fosse aberto, mas não houve consenso para urgência na análise da proposta. - É importante que a proposta seja aprovada e possa valer para o futuro - diz Delcídio.

"Ainda funcionamos como sociedades secretas"

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (PSDB-AM), sugeriu que a Casa discuta imediatamente a mudança do regimento para que as sessões sejam abertas:

- Na Câmara já é assim. Aqui ainda funcionamos como aquelas sociedades secretas.

Para o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que trocou empurrões com seguranças na entrada, a mudança é inevitável:

- A República venceu (a presença dos deputados), pena que a decisão do Supremo não tenha garantido que todos os cidadãos, e não só os deputados, pudessem assistir ao julgamento. Nossa expectativa, porém, é que essa tenha sido a última sessão secreta da história do Senado.

Antes do início do julgamento de Renan, vários senadores levantaram questões de ordem e questionaram a constitucionalidade do regimento do Senado.

- O regimento é claramente inconstitucional, e não poderia impedir o ingresso de deputados na sessão - disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Dias foi um dos dois representantes da Mesa que ficaram contra a decisão do vice-presidente da Casa de recorrer da liminar que permitiu o acesso dos deputados à sessão. O outro foi Papaléo Paes (PSDB-AP).