Título: Senadores boicotam Renan e pedem fim de sessão secreta
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 14/09/2007, O País, p. 3

DEPOIS DA ABSOLVIÇÃO

Clima de tensão preocupa governistas, que articulam licença do presidente da Casa.

Acrise que se arrastou por mais de três meses no Senado parecia mais intensa ontem de manhã, menos de 24 horas depois da absolvição do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Senadores de pelo menos seis partidos - PSDB, DEM, PSOL, PSB, PDT e PMDB -, inconformados com a permanência de Renan no comando da Casa, ameaçaram boicotar todas as reuniões de líderes dirigidas por ele e obstruir votações no Senado. Propuseram ainda um movimento em favor da ética no Congresso, cujo ponto de partida seria a defesa do fim do voto secreto e das sessões secretas na apreciação de processos de cassação de mandato de parlamentares.

O clima de tensão já preocupa os governistas, que nos bastidores tentam articular uma licença de Renan do cargo, ou pelo menos férias de 15 ou 20 dias.

- O ambiente está muito tenso. Jefferson Peres (PDT-AM) acabou de me anunciar que a CPMF não será aprovada depois do resultado de ontem (anteontem). Cresceu o ressentimento na Casa - reconheceu o vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC), que poderá assumir a vaga de Renan caso ele aceite se licenciar do cargo. - O ambiente está tenso. O ressentimento cresce e a hostilidade aumenta. Teremos profundas dificuldades para aprovar essa matéria legislativa que interessa ao governo, que interessa ao Brasil, porque estamos falando em R$36 bilhões ou mais de receita para investir em programas sociais e na área de saúde.

O movimento suprapartidário em favor do afastamento de Renan do comando do Senado foi organizado pelo presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), que conseguiu reunir num almoço em seu gabinete não só representantes da oposição como de três partidos da base governista. Além dos líderes do PSDB, do DEM e do PSOL, compareceram os senadores Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), Cristovam Buarque (PDT-DF) e Patrícia Saboya (PSB-CE).

- Esse não é um movimento da oposição, mas dos aliados com a ética - explicou o líder do Democratas, José Agripino Maia (RN).

Sem muitas esperanças de que Renan abra mão voluntariamente da presidência, Agripino considera que o mais produtivo no momento será garantir a aprovação de mudanças imediatas no regimento interno. Por meio de dois projetos de resolução, o líder do DEM considera possível que a Mesa Diretora do Senado assegure que nunca mais nenhum senador seja julgado em sessão secreta; e que todos os parlamentares que estejam respondendo a processo disciplinar no Conselho de Ética sejam afastados automaticamente do comando de comissões permanentes ou de cargos da Mesa Diretora da Casa.

Além disso, ele considera fundamental a aprovação da proposta de emenda constitucional que acaba com o voto secreto nesse tipo de julgamento. Já tramitam na Casa pelo menos quatros propostas neste sentido: três no Senado e uma na Câmara. Todas prontas para serem votadas em plenário, mas sem acordo, até agora, entre os partidos.

Na obstrução seletiva, o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), defendeu que nenhuma medida provisória relativa a créditos suplementares seja mais aprovada pelo Senado. Sua idéia é garantir maior rigor na análise da urgência e relevância das MPs editadas pelo Executivo. Essa foi a única das medidas com que o líder do PSB no Senado, Renato Casagrande (ES), não quis se comprometer de imediato.

- Eu comuniquei o (Renato) Casagrande sobre as iniciativas que pretendemos defender. Ele concordou com quase todas, menos com a relativa às medidas provisórias, já que o PSB faz parte da base governista - contou a senadora Patrícia Saboya, sem esconder sua insatisfação com o governo: - Está cada vez mais difícil permanecer no governo.

Ao chegar ontem ao Senado, e assumir o comando da sessão de debates, o senador Renan Calheiros não teve como deixar de ouvir o discurso do senador Cristovam Buarque, que lhe fez um novo apelo recomendando seu afastamento do comando da Casa.

- Depois de ter ganhado ontem, seria extremamente positivo que vossa excelência renunciasse à presidência do Senado. Daria uma paz ao Senado. Isso permitiria que a Casa voltasse ao seu funcionamento normal e nós nos recuperássemos de todas as feridas deixadas por essa crise. Sua renúncia deveria ser um gesto voluntário, um gesto de grandeza - propôs Cristovam.

- A democracia é bela porque permite gestos como este - limitou-se a responder Renan.

Outro que usou a tribuna para lamentar a difícil situação enfrentada pela Casa foi o senador Pedro Simon (PMDB-RS). Na sua opinião, a diferença do resultado do julgamento de Renan no Conselho de Ética e no plenário deveria ser motivo de uma reflexão do Senado.

- Eu não me lembro de ter visto esta Casa levar tanto pau como levou hoje. Nos 25 anos em que estou aqui como senador e nos 60 anos em que acompanho a vida política como cidadão, nunca vi - disse Simon.