Título: Políticos defendem voto secreto em alguns casos
Autor: Damé, Luiza e Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 16/09/2007, O País, p. 9

Para parlamentares, é preciso evitar pressões em votações de vetos presidenciais e escolhas de ministros do STF.

BRASÍLIA. A sessão fechada do Senado que salvou o mandato de Renan Calheiros (PMDB-AL) trouxe à tona a polêmica sobre o voto secreto no Congresso, mas nem todo voto secreto é necessariamente ruim. Após a absolvição do presidente da Casa, ganharam força as propostas de abrir o voto dos parlamentares em ocasiões como processos de cassação de mandato, por exemplo. O principal argumento evocado por parlamentares e cientistas políticos é que o povo tem direito de saber como atuam seus representantes.

Mas muitos defendem o voto fechado para situações em que o parlamentar se sinta acuado na hora de tomar uma decisão. É o caso da análise de indicações feitas pelo Palácio do Planalto de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). O Supremo tem, entre suas atribuições, julgar os parlamentares. Como votar abertamente contra a nomeação de um juiz que, no futuro, poderá ter nas mãos um processo contra o parlamentar?

Apesar de defender sessões e votações abertas em caso de cassação de mandato, o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que deixou de ser juiz no ano passado, cita uma série de casos em que o voto secreto se justifica para garantir a independência do parlamentar, principalmente em relação ao Executivo. Para Dino, o caso clássico é a análise de vetos presidenciais:

- No Congresso, há uma tendência de ampliar o uso do voto aberto. Mas o voto aberto incondicional não seria aprovado. Não se pode radicalizar a idéia de que todo voto secreto é errado. Em várias ocasiões, ele garante a independência do agente público, para evitar qualquer tipo de pressão.

Líder do DEM defende voto secreto em alguns casos

Flávio Dino é autor de uma proposta de emenda constitucional que abre o voto apenas em sessões de cassação de mandato.

O líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN), é um dos que defendem o voto secreto para a escolha de ministros do Supremo e de diretores do Banco Central, além de vetos presidenciais. Nos casos de cassação, Agripino defende sessão e voto abertos:

- Não somos favoráveis a simplesmente acabar com o voto secreto, mas nos processos de cassação tem de ser aberto.

Para o cientista político Paulo Kramer, professor da Universidade de Brasília (UnB), o clamor público era tão grande que, sob holofotes, os senadores seriam compelidos a atender à demanda da sociedade.

- Por mais embaraçoso que possa ser, até para as relações de amizade que naturalmente brotam do longo convívio entre os parlamentares, eu acho que o imperativo da transparência na democracia exige o fim do voto fechado - disse Kramer.

-------------------------------------------------------------------------------- Vem de longe a polêmica sobre votações secretas no Congresso. A discussão permeou um dos marcos da abertura democrática no país: a eleição de Tancredo Neves para presidente da República, no Colégio Eleitoral. O grupo de Paulo Maluf, candidato do Palácio do Planalto, pressionou para que a votação fosse fechada, mas foi derrotado na tese e na eleição.

- Houve escaramuças para que o voto fosse secreto, mas venceu a tese do voto aberto. É evidente que essa decisão favoreceu Tancredo: trouxe para ele a força das ruas, dos grandes comícios - lembra Jorge Bornhausen, um dos líderes da Frente Liberal, que apoiou Tancredo.

A discussão chegou a 1992, na votação do impeachment de Fernando Collor. A legislação e o regimento interno da Câmara não estabeleciam o rito de votação do impeachment. O Planalto pressionou o então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, para que a votação fosse secreta, o que favoreceria Collor. Sensibilizado pela mobilização da sociedade, Ibsen decidiu pelo voto aberto. Muitos deputados que apoiavam Collor mudaram o voto, e o impeachment foi aprovado por 441 votos a 38.

O voto secreto salvou o mandato do então prefeito de São Paulo, Celso Pitta, em 2000. Acusado de corrupção, ele foi inocentado pela Câmara de Vereadores. Logo depois, os vereadores aboliram o voto secreto. Em 2000, o senador Luiz Estevão (PMDB-DF) foi cassado em votação secreta, mas o painel foi fraudado e votos vieram a público.