Título: Batalha na Justiça
Autor: Couto, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 14/04/2009, Brasil, p. 8

Era para ser uma cesariana, mas o procedimento deixou Iléia Cerqueira, 29 anos, paraplégica (perda dos movimentos dos membros inferiores) e com uma grave lesão cerebral, em coma total e vegetativo. A jovem, que deu entrada no Hospital Regional de Taguatinga (HRT) em 31 de maio de 1996, sofreu uma parada cardiorrespiratória, após a aplicação da anestesia, segundo relato da mãe de Iléia, a dona de casa Neide Cerqueira, 47 anos. ¿A culpa foi do anestesista Arnoldo Furtado Silva, que após aplicar a medicação na minha filha, foi para a sala de repouso¿, denuncia. Neide só tomou conhecimento do real estado de saúde da filha em 2 de junho daquele ano. ¿Achei estranho, porque quando liguei para saber da Iléia, eles pediram para esperar por notícias na minha casa. Não aguentei e decidi ir até o hospital visitar minha filha e minha neta. A Iléia estava na UTI e parecia uma árvore de Natal, de tão inchada.¿

Ao mesmo tempo em que ganhava a neta Ilana Lima, hoje com 12 anos, a dona de casa iniciava uma batalha na Justiça para provar o erro médico do qual a filha foi vítima. ¿No dia da audiência, em 1998, Arnoldo disse que, após aplicar a anestesia, pegou uma caneta para anotar a medicação para a Iléia. Mas, graças a Deus, consegui provar, através de testemunhas, que ele foi descansar e ainda subestimou a vida da minha filha, afirmando que ela `já era¿, e só fez o processo de reanimação após pressão da equipe que trabalhava com ele¿, relata Neide. Condenado, o anestesista pagou 150 salários mínimos em 30 parcelas.

Numa das idas ao fórum para pegar documentos do processo, a dona de casa ficou sabendo que Arnoldo estava envolvido em outro erro médico. ¿Mas ele deu uma casa e dinheiro para a família da vítima e eles retiraram a queixa¿, relata.

Luta contra o tempo Neide ainda luta na Justiça para receber uma indenização do Estado pelo erro médico ocorrido no HRT. O seu advogado, Vicente Paulino, diz que tramita no Tribunal de Justiça do Distrito Federal uma ação que pede a condenação do Governo do Distrito Federal. ¿Os valores, que devem ser pagos em precatórios, já foram reajustados várias vezes. Estamos lutando contra o tempo para que a Iléia e seus familiares possam receber a indenização para amenizar o sofrimento e viverem com mais conforto e dignidade¿, explica. A família, que antes do erro médico morava em Samambaia, hoje vive numa casa modesta no Recanto das Emas.

Apesar de ser uma criança, Ilana ajuda a avó nos cuidados diários da mãe. Mesmo com a divisão de tarefas, Neide foi obrigada a abandonar o serviço de diarista. Sem falar, andar e demonstrar sentimentos, o único passatempo que resta a Iléia é a televisão. Ela passa o dia inteiro em frente ao aparelho. Só sai de casa para as consultas de rotina no hospital Sarah Kubitschek, geralmente duas vezes ao ano, ou em caso de alguma emergência.