Título: Gil reage a Caetano e diz que idéias sobre direito autoral não são vale-tudo
Autor: Lichote, Leonardo
Fonte: O Globo, 18/09/2007, O País, p. 4

Ministro propõe fórum nacional para debater pirataria e lacunas da legislação.

Em resposta às críticas que tem sofrido por suas idéias na área de direitos autorais, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, disse ontem que elas representam "o contrário do vale-tudo". Foi uma referência à declaração de Caetano Veloso feita no domingo, durante seminário sobre música em Santo Amaro, onde os dois estavam para celebrar o centenário de Dona Canô, mãe de Caetano. Na ocasião, Caetano afirmou que as propostas de Gil para o setor têm aspectos positivos, mas ressalvou que "o estímulo a esse negócio cria uma sensação de vale-tudo".

- Não defendo o vale-tudo, e sim que deve valer tudo o que está sendo colocado como desafio - disse o ministro, na sede do IBGE, no Rio, onde apresentava o Suplemento de Cultura da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (leia reportagem no Segundo Caderno). - A gestão coletiva dos direitos autorais, feita por editoras e gravadoras, é ainda um setor importantíssimo. Mas não podemos fechar os olhos para a autogestão, feita pelo artista. A internet pressiona nesse sentido. O Creative Commons tem hoje mais de 150 milhões de obras licenciadas. Como as políticas do governo podem ignorar essas iniciativas? - indagou Gil.

Desde o início de sua primeira gestão, Gil tem se mostrado favorável a propostas como a do Creative Commons - forma de licenciamento na qual o autor pode determinar antecipadamente os tipos de usos gratuitos que podem ser feitos de sua obra, sem a necessidade de um pedido de autorização. Muitos entendem que, assim, o ministro estaria defendendo o fim dos direitos autorais. Gil repudia a acusação.

- O setor de direito autoral do Ministério da Cultura tinha três funcionários em 2003, e hoje tem 20. Estamos dotando o Estado de ferramentas para controlar e fiscalizar o direito autoral, garantir o recebimento a seus titulares. É o contrário do vale-tudo - disse Gil, elevando a voz. - Estamos propondo um fórum nacional para debater questões como o problema da pirataria e as lacunas da legislação.

Hoje, a cópia de uma música para um aparelho reprodutor de MP3 viola as leis nacionais, por exemplo.

Modelo clássico está em xeque, diz ministro

A tensão entre Gil e uma parcela dos compositores brasileiros no debate sobre direitos autorais não é nova, mas foi reaquecida com a publicação no GLOBO, no último dia 7 de setembro, de um artigo do compositor Fernando Brant. O texto lembra que Gil não tem todas as suas músicas licenciadas pelo Creative Commons e faz um paralelo entre o ministro e Thomas Jefferson, que "atacava a escravidão em seus textos", mas "mantinha 200 escravos negros sob sua posse".

- A realidade emite sinais de mudanças, com a internet, a pirataria, os novos modos de produção de cultura - diz Gil. - Isso coloca em xeque o modelo clássico. A primeira reação vem dos autores que não são intérpretes. É natural uma reação vinda do setor mais ameaçado pelas mudanças.