Título: Renan não consegue votar
Autor: Vasconcelos, Adriana e Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 19/09/2007, O País, p. 3

DEPOIS DA ABSOLVIÇÃO

Com senador na presidência, oposição obstrui votações; Conselho adia julgamento.

No primeiro confronto com a oposição, depois de sua absolvição no julgamento da semana passada, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), saiu perdendo. Apesar da Casa cheia - pelo menos 73 senadores registraram presença -, prevaleceu o processo de obstrução comandado por PSDB e Democratas, que esvaziou o plenário e impediu ontem a aprovação da indicação de Luiz Antônio Pagot para a direção geral do Departamento Nacional de Infra-Estrutura e Transportes (Dnit). Sem alternativas, depois de esperar por quase 20 minutos e com apenas 37 senadores dispostos a votar a matéria, Renan foi obrigado a encerrar a sessão.

Nova tentativa será feita hoje. Já a reunião do Conselho de Ética, que estava marcada para hoje, foi adiada para a semana que vem. O impasse pode permanecer diante da postura de Renan de continuar no comando da Casa. Seu afastamento temporário é pedido pela oposição e por peemedebistas. E, ontem, também foi solicitado pelo senador petista Aloizio Mercadante (SP). Renan, no entanto, adiou o encontro que teria ontem com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e chegou ao Senado repetindo que não vai se licenciar do cargo.

- Licença, essa coisa não existe. Licença, férias, nunca existiram. Até terça-feira, a decisão era minha; depois de quarta-feira, a decisão quanto à minha inocência e à permanência é do Senado. Em todo Parlamento democrático do mundo, cabe à maioria decidir e à minoria entender - afirmou Renan.

A convocação de Renan para o início da ordem do dia (votação em plenário), sem qualquer negociação prévia com os líderes partidários, foi encarada pela oposição como uma provocação. - Não deixa de ser uma provocação. Vamos esticar a corda. Vamos à obstrução - reagiu o líder do Democratas, senador José Agripino (RN).

Governo vencido pelo cansaço

Iniciou-se então uma queda de braço entre governo e oposição. Diante do plenário cheio, tucanos e democratas optaram por vencer os adversários pelo cansaço. Primeiro, apresentaram diversos requerimentos, na tentativa de adiar ao máximo o início da votação da indicação de autoridades. Entre eles, um propondo o adiamento da votação da indicação de Pagot para o Dnit, que chegou a ser rejeitado com 36 votos contra, quatro a favor e uma abstenção.

Os governistas chegaram a se animar com a votação desse requerimento, mas logo em seguida não conseguiram reunir o quórum mínimo de 41 senadores para dar continuidade à votação do mérito da proposta, mesmo depois de o líder do DEM ter liberado pelo menos dois senadores de sua bancada que estavam dispostos a referendar a indicação de Pagot: Jayme Campos e Jonas Pinheiro, ambos do Mato Grosso. Renan se conformou:

- Diante do quadro, encerro a sessão e convoco outra para amanhã - afirmou.

O presidente do Senado iniciou o dia de ontem confiante. Depois de ter solicitado quinta-feira uma audiência com o presidente Lula - informação confirmada pelo Planalto -, Renan decidiu não ter um encontro oficial, depois de avaliar com aliados que qualquer versão que fosse divulgada dessa reunião seria negativa para ele. Renan temia a versão de que Lula o estaria recebendo com constrangimento ou que tivesse insistido para que ele se licencie da presidência do Senado. Chegou a negar que tivesse pedido o encontro:

- Não (pedi), eu falo com o presidente toda vez que é necessário, com muita naturalidade. Mas não tem nada urgente para conversar. Quando preciso falar, eu falo com naturalidade. Eu ligo para ele, ele liga para mim. Nunca houve dificuldades. Mas, por enquanto, não há nada urgente para ser conversado.

Anteontem à noite, o vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC), teve um encontro com Renan e solicitou dele um gesto para pacificar a Casa. Ouviu do presidente que ele não tomaria nenhuma atitude enquanto a oposição estivesse pressionando pelo seu afastamento. Ontem, Viana participou de um encontro, no gabinete do senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), com os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Demóstenes Torres (DEM-GO), em busca de um entendimento. Mas não houve acordo.

- Não tem chance de diálogo. A oposição disse que não faz qualquer gesto enquanto Renan estiver presidindo o Senado. E Renan disse que não há chance de tratar qualquer coisa enquanto a oposição colocar restrição à sua permanência no cargo. O impasse continua e, enquanto isso, a votação da CPMF começa a ter o seu prazo cada vez mais apertado - alertou Viana.

Oposição resiste a discutir um acordo

Vários senadores estão tentando negociar com a oposição um entendimento. Mas os principais líderes do DEM e do PSDB demonstram resistência em fazer qualquer acordo.

- É preciso ter uma saída. A oposição não pode colocar o Renan contra a parede. O momento agora é de procurar uma saída para essa situação - disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Renan reagiu ao argumento de que sua presença à frente da Casa coloque em risco a aprovação da CPMF, e se eximiu de responsabilidades sobre a proposta de emenda constitucional (PEC) que prorroga a cobrança do tributo até 2011. Para ele, a proposta é assunto do governo.

- Sempre tenho colaborado com a governabilidade, o país precisa disso. Vou colaborar no que puder. Mas esse problema de CPMF não é do presidente do Senado. Eu sou presidente da instituição, que é suprapartidária. Ela é composta por diversos partidos. (A CPMF) é um problema de governo, que tem de ser tratado pelos partidos, pelos líderes, pelos senadores, não pelo presidente do Senado - disse.