Título: A nova História de Chávez
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 19/09/2007, O Mundo, p. 34

Reforma do currículo escolar da Venezuela pretende apagar da cartilha período colonial.

Os novos venezuelanos que o governo do presidente Hugo Chávez pretende formar nos próximos anos saberão falar inglês, jogar xadrez, conhecerão muito pouco sobre o processo de colonização do país, desconhecerão a existência da Comunidade Andina de Nações (CAN), e estudarão, em detalhe, processos revolucionários que tiveram como cenário países como Coréia do Norte, México e Cuba. Segundo versão preliminar do novo currículo escolar que está sendo elaborado pelo governo chavista e que seria divulgado em dezembro, os textos que serão entregues às escolas de todo o país incluirão drásticas modificações em relação ao currículo atual.

A ONG Assembléia Nacional de Educação teve acesso a um documento preliminar, de 500 páginas, que explica algumas das alterações que o governo venezuelano pretende fazer no currículo escolar.

- Vemos três pontos positivos: o ensino de inglês não só seria mantido como começaria já na 5ª série, e não no Ensino Médio; também reforçariam as matérias de informática; e incluiriam aulas de xadrez - disse ao GLOBO o coordenador da ONG e especialista em educação, Leonardo Carvajal, por telefone, de Caracas.

Segundo ele, um dos aspectos mais graves da reforma se refere às ciências sociais, sobretudo à história.

- O currículo vai refletir a ideologia de Hugo Chávez. A idéia seria cultivar e destacar os valores e as contribuições das culturas indígena e afro-americana e anular qualquer menção ao processo de colonização do país, à imigração espanhola, portuguesa e italiana - explicou Carvajal.

Reforma prepara jovens para invasão

No documento, a equipe comandada pelo ministro do Poder Popular para a Educação, Adán Chávez, irmão do presidente, propõe eliminar o conceito de mestiço.

- Ao eliminar o processo de mestiçagem, nossa identidade nacional passa a ser algo puro, o que é profundamente militarista - enfatizou o coordenador da ONG.

A História venezuelana também excluiria lideranças políticas e blocos regionais do século XX, como a CAN.

- O texto menciona os grandes heróis de nossa independência e deles passa diretamente para Chávez. Também foi excluída a CAN, uma organização fundada, entre outros países, pela Venezuela - comentou Carvajal.

O documento prevê o estudo de outros blocos regionais, como a Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba), liderada por Chávez e pelo líder cubano, Fidel Castro, e o Mercosul. Os alunos venezuelanos também estudariam outros aspectos do governo chavista, como a criação da Petrosul, empresa estatal formada pelos governos da Venezuela, Argentina e Brasil.

- É típico de regimes totalitários eliminar qualquer fenômeno ou iniciativa que não seja uma criação do ditador ou que represente uma fobia para ele - disse o especialista.

O documento, disse Carvajal, "fala da necessidade de preparar os rapazes para uma eventual invasão". Com a chegada de Chávez ao poder, em 1999, a disciplina instrução pré-militar, do Ensino Médio, passou a ser obrigatória. A reforma, disse o coordenador da ONG, reforçaria o perfil militar do currículo escolar venezuelano. Também passariam a ser estudados movimentos revolucionários em oito países: Coréia do Norte, Vietnã, China, Cuba, Nicarágua, México, Chile e Japão.

- Quando falam no México não se referem ao México de (Vicente) Fox e sim à Revolução Mexicana do século passado, claro - afirmou Carvajal.

A versão preliminar do documento também menciona o ensino de categorias como marxismo-leninismo, socialismo do século XXI e capitalismo, mas exclui outras como fascismo, liberalismo e de outros tipos de socialismo. Segundo a Assembléia Nacional de Educação, "o governo quer formar crianças com uma mentalidade agressiva".

- Querem criar uma Esparta do século XXI - disse Carvajal.