Título: Em 4 anos, miséria pode cair a 'níveis residuais'
Autor: Ribeiro, Erica
Fonte: O Globo, 21/09/2007, Economia, p. 35

Segundo Ipea, 17,2 milhões estão fora da faixa de indigência graças a benefícios sociais.

BRASÍLIA e BUENOS AIRES. O Brasil poderá reduzir a pobreza extrema a "níveis residuais" em quatro anos, diz estudo divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Para isso, segundo técnicos, terá de manter a redução da pobreza extrema no mesmo ritmo registrado entre 2004 e 2006. Ao analisar os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2006), o Ipea apontou que 17,2 milhões de pessoas estão fora da faixa de indigência graças à previdência e à assistência social.

O assessor da presidência do Ipea Ricardo Amorim não acredita ser excesso de otimismo falar na quase erradicação da extrema pobreza, que considera pessoas que sobrevivem com menos de um quarto de salário mínimo por mês (R$95). No ano passado, estavam nessa situação 21,7 milhões de brasileiros. Sem os benefícios da rede de proteção social, o número saltaria para 38,9 milhões. - O país voltou a crescer, a indústria retomou a sua atividade, a agricultura também. Isso tem puxado a renda do país inteiro, com efeitos mais fortes nas camadas mais pobres - disse Amorim. O Ipea sugere que a queda na taxa de atividade verificada entre 2001 e 2006 - de 62,9% para 62,4% - pode ser um "efeito colateral" do Bolsa Família, criado em outubro de 2003. A hipótese é que, com mais dinheiro no bolso, integrantes de famílias pobres tenham abandonado formas precárias de trabalho e até voltado a estudar. A queda na taxa, que mede a proporção de pessoas aptas a trabalhar e que buscaram alguma ocupação, foi concentrada nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Amorim rejeitou que o Bolsa Família possa levar trabalhadores a deixar o emprego para viver só com o benefício, de R$18 a R$112 por mês. A quantia, diz, seria insuficiente para se abandonar o trabalho, embora seja "ajuda valiosa" para quem vive na pobreza.

O estudo mostra que a desigualdade vem caindo desde 2001. Mas, entre 2001 e 2004, só os mais pobres ganharam renda. De 2004 a 2006, todos passaram a ganhar mais, e os mais pobres tiveram um acréscimo proporcionalmente maior.

Argentina: sob suspeita, taxa de pobreza diminui

"Reduções continuadas e duradouras na desigualdade envolvem melhorias em duas frentes: tanto em uma melhor distribuição da renda do trabalho como em um sistema de seguridade que transfira renda dos mais ricos para os mais pobres. E, de acordo com a Pnad, desde 2004 o Brasil vem conseguindo avançar de forma consistente nas duas frentes", diz o texto.

Em Buenos Aires, alheio às denúncias de intervenção no Indec (o IBGE argentino), o presidente argentino, Néstor Kirchner, disse ontem que no primeiro semestre a taxa de pobreza do país recuou para 23%, abaixo dos 60% alcançados quando assumiu o poder, em 2003. As declarações foram criticadas pela oposição, que acusa a Casa Rosada de manipular indicadores, como o Índice de Preços ao Consumidor, usado para calcular a pobreza. (Colaborou Janaína Figueiredo, correspondente.)