Título: Acho que minha demissão foi política
Autor: Barbosa, Adauri Antunes
Fonte: O Globo, 23/09/2007, O País, p. 4
Diretor demitido da Petrobras responsabiliza Lula e Dilma por sua saída.
Demitido anteontem da diretoria de Gás e Energia da Petrobras, Ildo Sauer atribui ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a responsabilidade política por sua saída. Sauer divulgou sexta-feira carta explicitando divergências com o governo e a condução do programa de energia. Ontem, em entrevista ao GLOBO, aprofundou as críticas: segundo ele, o programa de biodiesel, menina dos olhos de Lula, comandado por Dilma, está sendo um desastre, assim como a gestão da ministra no setor de energia. De volta à USP, da qual é professor, Sauer diz que o governo tem de responder pelo que está ocorrendo na Petrobras. "Foi decisão dele (Lula) e da Dilma. Eles é que têm que responder se estão loteando, se não estão loteando, por que estão fazendo isso. É um problema deles."
Adauri Antunes Barbosa
O senhor diz , na carta em que comunica seu afastamento, que recebeu a notícia de sua demissão "sem alegria" e "sem espanto". Por quê?
ILDO SAUER: O sentimento já está na carta.
O senhor não ficou surpreso com a decisão do governo?
SAUER: Não fiquei surpreso... Depois de cinco anos de pressão contínua.
Quem pressionava?
SAUER: Todo mundo sabe. Manifestei por escrito várias vezes as minhas preocupações com o modelo do setor elétrico.
O PT pediu a sua saída da Petrobras?
SAUER: O PT era contra a minha saída. Está errado quem diz que o PT queria minha saída. Só havia uma figura que queria minha saída.
A ministra Dilma Rousseff?
SAUER: Todo mundo sabe disso.
Quais são as divergências com a ministra Dilma?
SAUER: O que penso está na carta. Há diferenças sobre a gestão no setor. O Ancelmo (Gois, em sua coluna ontem no GLOBO) escreveu direito. Acho que a gestão dela no setor de energia é um desastre para o país.
Foi uma questão pessoal?
SAUER: Não sei se minha demissão foi pessoal. Acho que minha demissão foi política.
Por que foi questão política?
SAUER: Fiquei lutando para organizar o setor de gás no Brasil, para se organizar o mercado de gás, para se organizar o setor elétrico. Acabamos com a bandalheira que havia nas termoelétricas, como está escrito na carta. Organizamos o setor de biodiesel, o retorno da Petrobras ao álcool. Diferentemente do desastre que está sendo o biodiesel comandado lá pelo ministério. Em Brasília todo mundo sabe que está enfrentando dificuldades.
As dificuldades têm a ver com o loteamento da Petrobras?
SAUER: Quem tem que responder isso é o Lula, não é? A decisão é dele, ele é que tem que responder por isso. Não foi o que foi prometido quando o Lula foi eleito a primeira vez e nós o elegemos.
O que Lula prometeu?
SAUER: Está no programa de governo o que seria feito no programa de energia. Está escrito lá.
Lula não cumpriu o que prometeu?
SAUER: Não cumpriu. Acho que estão nos devendo, não é?
Esse loteamento prejudica a Petrobras?
SAUER: Só o futuro dirá.
E o seu futuro pessoal, depois da saída da Petrobras?
SAUER: Sempre fui professor da USP. Embora oficialmente afastado, continuei dando aulas, mantive a disciplina aos sábados. Agora volto para a universidade. Sou da carreira, estou na USP há 15 ou 16 anos.
Essas alianças para o governo de coalizão do presidente Lula podem prejudicar o país?
SAUER: Isso é o Lula que tem que responder. É decisão dele. Não é do PT, é dele. O PT se manifestou contrário à minha saída. Foi decisão dele e da Dilma. Então eles é que têm que responder se estão loteando, se não estão loteando, por que estão fazendo isso. Isso é um problema deles.
E a Petrobras pode ser prejudicada com o loteamento da direção?
SAUER: O futuro dirá. Normalmente o loteamento não conduz a bons resultados. Mas esse é um problema do governo agora, não é meu.
O senhor tem alguma mágoa?
SAUER: Eu me manifestei na carta ontem. Estou preferindo não manter o tiroteio. O que tinha que dizer já disse ontem na hora do afastamento. Vou para a universidade e continuar contribuindo para melhorar esse país, especialmente no setor de energia, que está tão carente agora, enfrentando dificuldades.