Título: Bush chama Lula de evangelizador do etanol
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 25/09/2007, O País, p. 3

EUA anunciam a disposição de flexibilizar subsídios agrícolas; já Brasil diz que só negocia em bloco.

Flexibilização foi a palavra-chave do encontro de ontem entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e George W. Bush no Hotel Waldorf Astoria, em Nova York, que durou 45 minutos, pouco mais do que o previsto. Os dois presidentes reafirmaram a disposição de retomar as negociações da Rodada de Doha, mas Lula deu a entender que os avanços dependem da capacidade da diplomacia brasileira de convencer os países do G-20 (o grupo de nações em desenvolvimento, liderado por Brasil, Índia e China) a avançar nas negociações.

A Rodada de Doha está suspensa por impasses nas negociações agrícolas, já que os países ricos se recusavam a reduzir seus subsídios. O Brasil, como outros países em desenvolvimento, busca retomar as negociações de Doha na Organização Mundial do Comércio (OMC).

- Cada vez que nos encontramos temos uma discussão proveitosa. Agradeci a liderança de Lula na questão (do etanol) na América Latina e no Haiti. Ele tem sido um evangelizador na questão do etanol. Compartilhamos o compromisso de uma rodada exitosa de Doha. Garanto que o presidente dos EUA tem flexibilidade para alcançar resultados - disse Bush após o encontro.

Subsídios agrícolas foram a pauta

Lula elogiou a disposição de Bush de negociar, mas deixou claro que essa negociação será feita em bloco:

- Estamos convencidos que tanto a questão de Doha quanto a das mudanças climáticas dependem de alguns fatores. Um deles é a disposição de um país importante como os EUA de demonstrar flexibilidade. Bush tem demonstrado disposição de flexibilizar, e Doha é uma oportunidade para que países ricos possam dar sua contribuição para países pobres. Se nós pudermos convencer a Índia, a Rússia, a China, o México, a União Européia e o Japão, poderemos dar notícias boas sobre Doha nos próximos dias.

A conversa de Bush e Lula girou em torno da redução dos subsídios agrícolas americanos. Os EUA têm um teto de US$47 bilhões anuais para subsídios agrícolas, mas no ano passado gastaram apenas US$9 bilhões. Isso ocorreu porque a alta das commodities agrícolas no mercado fez com que os produtores americanos não precisassem recorrer tanto à ajuda governamental. O governo brasileiro pediu a redução desse teto para US$12,5 bilhões. Já os americanos querem, em contrapartida, a redução do teto das tarifas de importação para produtos industriais, dos atuais 35% para 12%.

Do encontro entre Lula e Bush também participaram o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, a secretária de Comércio, Susan Schwab, o conselheiro Ed Gillespie, e Dan Fisk, membro do Conselho de Segurança dos EUA para a América Latina.

Enquanto Lula tinha encontros bilaterais na ONU com os chefes de governo de Polônia, Coréia do Sul, Timor Leste, República Tcheca e Alemanha, o chanceler Celso Amorim almoçou com os ministros das Relações Exteriores de Rússia, Índia e China (os países que formam o grupo chamado Bric), na residência oficial da representante brasileira da ONU, Maria Luíza Viotti.

Na saída, Amorim registrou a disposição dos americanos para negociações no âmbito da OMC.

- Antes, eles (os americanos) falavam em subsídios agrícolas de US$22 bilhões ao ano. Depois falaram em US$17 bilhões. Agora os americanos falam em algo entre US$13 bilhões e US$16,5 bilhões. Foram os números mencionados pela secretária de Comércio dos EUA, Susan Schwab, com quem vou me encontrar amanhã (hoje). Se o governo americano se aproximar dos US$13 bilhões, haverá acordo. Aliás, como disse o presidente Lula, quanto mais eles se aproximarem do teto de US$13 bilhões, mais facilmente chegaremos a um acordo. Há um avanço inegável. Estamos num bom grupo, de países emergentes, e podemos fazer dessa união uma oportunidade de transformar a política e o diálogo com os americanos - avaliou Amorim, que também destacou a disposição da chanceler Angela Merkel, da Alemanha, de avançar as conversas do lado da União Européia.

Amorim também disse que, do lado brasileiro, há uma negociação quanto à flexibilização das tarifas de importação de produtos industriais, mas não informou quais são os números que estão sendo negociados.

- Esta é uma decisão delicada, e pretendemos levar em questão as sensibilidades brasileiras no setor industrial. Há setores mais sensíveis do que outros, de modo que será preciso atenção. Além disso, estamos trabalhando com um acordo que prevê cotas de importação, e nós dissemos aos americanos que não é justo que haja cotas de importação agrícolas e limites de valores de importação do lado deles, sem que haja o mesmo do nosso lado. Ou liberamos esses limites de importação ou mantemos dos dois lados - disse Amorim.

Referência indireta a Hugo Chávez

Depois do encontro com Bush, Lula saiu para o jantar com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, e outros 20 chefes de Estado e de governo, na sede da ONU. A secretária Susan Schwab concordou em ter hoje um novo encontro com o ministro Celso Amorim para detalhar melhor as negociações que ambos consideraram, segundo o ministro, como uma retomada dos entendimentos para chegar a um resultado positivo na Rodada de Doha.

- O diabo mora nos detalhes, e por isso as negociações de números e de cotas são tão delicadas - esquivou-se Amorim.

Indagado sobre se os dois presidentes falaram de Hugo Chávez, da Venezuela, Amorim respondeu:

- Eu diria que não... Mas Bush fez questão de elogiar a liderança moderada do Brasil no continente, o que sempre quer dizer uma referência indireta a Chávez, a não ser que a minha interpretação esteja errada.

AHMADINEJAD BATE BOCA COM REITOR DE COLUMBIA, na página 27