Título: Mônaco decide sobre Cacciola até novembro
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 25/09/2007, Economia, p. 23

Previsão é do diretor de Justiça do principado. Tarso é 1º ministro a ir a Monte Carlo para processo do gênero.

MONTE CARLO. Em meio a uma rasgação diplomática de seda com o ministro da Justiça, Tarso Genro, o diretor de Serviços Judiciários de Mônaco, Philippe Narmino, que ocupa um cargo equivalente ao do brasileiro no principado, disse ontem acreditar que a decisão sobre o pedido de extradição de Salvatore Cacciola sairá até 15 de novembro. Narmino admitiu ainda ser a primeira vez que uma autoridade ministerial - Tarso - marca presença no principado para um processo do gênero.

O diretor de Serviços Judiciários ressaltou que o processo está em fase de instrução junto à Justiça monegasca, até que o Brasil entregue a tradução, do português para o francês, da sentença de condenação do ex-banqueiro, de 2005, e uma confirmação do mandado original de prisão expedido em 2000 pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo Tarso, que ontem se reuniu com Narmino e com a procuradora-geral de Mônaco, Annie Brunet-Fuster, a versão da sentença, que está a cargo de pelo menos dez tradutores juramentados a serviço da embaixada brasileira em Paris, será entregue a Mônaco até a próxima terça-feira, um dia antes do vencimento do prazo inicial de 20 dias dado a Brasília para apresentar o pedido de extradição. Se o Brasil entregar a documentação no prazo, o Tribunal de Recursos pode começar a analisar o processo em 20 de outubro, disse Narmino.

A lei do principado prevê 20 dias adicionais, caso necessário. A confirmação seria entregue o mais rapidamente possível. Para Narmino, é pouco provável que o ex-banqueiro consiga ser libertado antes do fim do processo.

Annie, responsável pela prisão preventiva de Cacciola e que na sexta-feira havia criticado a visita de Tarso - afirmando ser mais importante para o processo que os documentos requeridos chegassem ao principado -, entrou muda e saiu calada da entrevista coletiva concedida ontem, numa das salas do Palácio da Justiça de Mônaco.

A cara fechada com que a procuradora assistiu a Tarso e Narmino - seu superior na hierarquia - falarem sobre a importância da cooperação dos dois países em questões judiciais deu a entender que suas declarações de sexta-feira teriam provocado algum tipo de mal-estar.

- Em todas as formas de cooperação internacional, é importante ter um contato próximo. Imagino que o ministro tenha viajado para ressaltar a importância desse caso para o Brasil. Sentimo-nos honrados que ele tenha percorrido milhares de quilômetros para tanto. Seria importante para nós, porém, saber o que se passou entre 2000 e 2007 - disse Narmino.

Mônaco não tem tratado de extradição, mas a legislação do principado autoriza o procedimento. Segundo informações do Departamento de Serviços Jurídicos, uma maioria não especificada dos 40 pedidos entregues ao principado nos últimos cinco anos foi aceita. O caso de Cacciola despertou interesse especial das autoridades locais porque Mônaco, há algum tempo, tenta mostrar à comunidade internacional que o status de paraíso fiscal não é sinônimo de abrigo de foragidos da Justiça.

Tarso se mostrou otimista com o pedido brasileiro, que, garantiu, tem substância técnica suficiente para ser acolhido. Mas Tarso contradisse Narmino ao declarar que a lista de documentos entregues ontem às autoridades do principado já serviria para dar andamento ao processo. O ministro disse que respeitará a decisão do principado, mesmo que seja desfavorável. Embora protocolarmente ela caiba ao príncipe regente, Albert II, a decisão de fato é tomada pelo Tribunal de Recursos.

Tarso nega que viagem tenha conotação política

Tarso também aproveitou para rebater as críticas de que o governo estaria dando conotação política ao caso Cacciola. Disse não apenas que tinha o objetivo de demonstrar a Mônaco que as autoridades brasileiras contavam com amparo legal para requisitar a extradição do ex-banqueiro, como também de abrir conversações na área de cooperação judicial.

- Não fiquei incomodado com qualquer crítica. Vi preocupação de alguns colunistas de que (este caso) fosse atingir o governo anterior. Mas entendo que era uma preocupação com os seus, o que é natural. O caso não tem qualquer natureza política, até porque foi iniciado no governo anterior.

Tarso, que chegou a Mônaco na manhã de ontem, viajou, logo após o encontro com Narmino, para Paris, de onde volta hoje para Brasília. Já Narmino ainda teve tempo para perguntar aos repórteres brasileiros sobre a repercussão do caso Cacciola no Brasil.

Mônaco tem um dos menores índices de criminalidade do mundo, e autoridades do principado já haviam revelado sua surpresa com o interesse despertado pela prisão do ex-banqueiro, algo que não era visto desde 1999, por ocasião da morte do banqueiro brasileiro Edmond Safra.

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