Título: Brasil assume a sua parcela
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 26/09/2007, O País, p. 3

Até então, Lula atribuía responsabilidade por aquecimento global a países desenvolvidos.

BRASÍLIA. Cansado de ser cobrado em todos os fóruns internacionais cujo ponto central é a mudança climática, o Brasil decidiu dar uma reviravolta em sua participação durante a reunião da Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU) e partiu para o ataque. A posição mais agressiva foi demonstrada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que até então ocupava-se de atribuir a responsabilidade pelo aquecimento global aos países desenvolvidos. Em todas as oportunidades que teve esta semana, Lula distribuiu um documento de 42 páginas com um balanço do que já foi feito por seu governo para contribuir com a redução das emissões de gases que provocam o efeito estufa na atmosfera.

Com a divulgação do balanço, denominado "Contribuição do Brasil para evitar a mudança do clima", o governo brasileiro prepara o terreno para lançar um plano estratégico com metas internas para os setores público e privado, nos dias 13 e 14 de dezembro, durante a Conferência de Bali, na Indonésia. O evento tem por objetivo traçar o mapa das negociações para um novo acordo global contra o aquecimento do planeta, que substitua o Protocolo de Kioto. O Brasil assumirá novos compromissos, que incluem desde o desmatamento até a inspeção veicular, para limitar a emissão de gases pelos automóveis. Mas não serão metas numéricas, explicou ao GLOBO uma fonte do governo, para que não haja cobranças futuras.

Ao longo de sua estada em Nova York, Lula fez questão de mostrar que, embora não seja obrigado a cumprir metas quantitativas estabelecidas em tratados como o Protocolo de Kioto, os brasileiros estão fazendo sua parte e podem assumir compromissos mais ambiciosos, desde que decididos internamente e sem a interferência das nações industrializadas. Países como os Estados Unidos - que não fazem parte do acordo multilateral - afirmam que só se engajarão nessa luta se as nações emergentes, entre elas o Brasil, fizerem o mesmo.

- Nossa linha é de que as responsabilidades são comuns, porém diferenciadas - disse, por telefone, de Nova York, o chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério do Meio Ambiente, Fernando Lyrio.

O documento, elaborado por cinco ministérios - Itamaraty, Meio Ambiente, Desenvolvimento, Minas e Energia e Ciência e Tecnologia - foi exaustivamente distribuído. Em um jantar, na noite de segunda-feira, com um seleto grupo de chefes de estado, entre os quais o presidente americano George W. Bush, o francês Nicolas Sarkozy e a chanceler alemã Angela Merkel, Lula entregou um exemplar a cada um deles.

A divulgação continuou durante todo o dia de ontem às delegações estrangeiras e amanhã, em Washington, o texto voltará a ser apresentado, durante um encontro entre representantes dos 20 maiores países emissores de gases poluentes, entre os quais o Brasil.

"O Brasil não tem, de acordo com o regime da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (CQNUMC), obrigações quantificadas de limitação ou redução de emissões. Contudo, o país está atuando de forma decisiva e dando contribuições concretas para a luta contra a mudança do clima", diz um trecho do documento.

Um dos pontos fracos do Brasil, quando o assunto é meio ambiente, é a Amazônia. Lula enfatizou que o desmatamento na floresta está cada vez menor, nas conversas que teve com outros chefes de Estado. Destacou ainda que o governo está dando incentivos para recuperar áreas já devastadas e vem melhorando a fiscalização, o licenciamento e o controle.

- Nossa estratégia é fazer com que a comunidade internacional veja que somos mais vítimas do que vilões, por conta dos altos níveis de emissões dos países industrializados - disse uma importante fonte do Itamaraty.

Outro ponto que serve de propaganda ao Brasil e foi largamente explorado por Lula diz respeito à produção de combustíveis renováveis, como o etanol e o biodiesel. O documento apresentado pelo presidente informa que, em 2005, a participação das fontes renováveis de energia no Brasil era de 44,5% na matriz energética, enquanto nos países desenvolvidos o percentual era de apenas 6,1%. No mundo, o índice ficou em 13,1%. Além disso, desde a década de 70, as fontes primárias de energia das hidrelétricas e de produtos da cana-de-açúcar aumentaram em dez vezes. - As fontes de energia renováveis não contribuem para as emissões de gases de efeito estufa - disse Fernando Lyrio.