Título: Bovespa bate recorde, mas Meirelles vê risco
Autor: Beck, Martha e Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 26/09/2007, Economia, p. 27

Para presidente do BC, mundo seria afetado por recessão nos EUA. Dólar cai a R$1,861.

RIO e BRASÍLIA. Depois de cair 1,28% durante o dia, digerindo dados negativos da economia americana, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) virou e o índice Ibovespa (que reúne as ações mais negociadas) encerrou com mais um recorde, aos 58.857 pontos, em alta de 0,24%. Já o dólar caiu 0,43%, para R$1,861. É a cotação mais baixa desde 23 de julho, véspera do acirramento da crise do mercado de hipotecas de alto risco dos EUA, as chamadas subprime. O risco-Brasil caiu 1,74%, para 169 pontos centesimais.

O presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, no entanto, ainda vê riscos de que os Estados Unidos entrem em recessão no curto prazo, com conseqüências para os demais países, especialmente aqueles dependentes das exportações para o mercado americano. Ele destacou, porém, que este cenário é o menos provável. A crise desencadeada pelos créditos imobiliários podres dos EUA no fim de julho se amenizou nos últimos dias, mas ainda não é considerada debelada.

O índice de confiança do consumidor americano, apurado pelo Conference Board, recuou este mês de 105,6 para 99,8, contra uma expectativa de 104.5. É a menor leitura desde os 98,3 registrados em novembro de 2005, quando os preços da gasolina dispararam por causa da passagem do furacão Katrina. Para piorar, a Associação Nacional dos Corretores informou que a venda de imóveis usados caiu 4,3% em agosto, pelo sexto mês consecutivo, para 5,5 milhões de unidades. É o menor patamar desde agosto de 2002. E o preço dos imóveis registrou a maior queda em 16 anos, segundo pesquisa da S&P/Case-Shiller: 4,5%.

Fábio Cardoso, analista da Máxima Asset Management, avalia que o enfraquecimento da economia nos EUA sinaliza para uma provável nova redução dos juros americanos e nos brasileiros. Isso beneficiaria as empresas com ações negociadas na Bolsa, que pagariam menos juros para se financiar, além de atrair investidores para as ações, em busca de maiores ganhos. No mês, o saldo de investidores estrangeiros na Bolsa está positivo em R$2,197 bilhões até dia 20.

Apesar da crise, o presidente do BC espera crescimento mundial saudável:

- A maior probabilidade é que exista uma desaceleração da economia americana, mas que isso afete em grau moderado a economia mundial, que ainda cresceria a taxas saudáveis este ano e possivelmente o ano que vem.

Meirelles fez ontem sua prestação de contas trimestral ao Senado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Ele disse que o BC estuda mudar, de forma gradual, parte da composição das reservas internacionais, hoje acima dos US$160 bilhões. Ou seja, que ela não seja feita apenas por ativos em dólar, mas em outras moedas.

Senador: Meirelles parece um "Deus Sol" no governo

A audiência de Meirelles contrastou com as anteriores, quando a base governista o atacava e cabia à oposição defendê-lo, devido aos questionamentos sobre a velocidade de redução da taxa básica de juros. Os elogios foram tão rasgados que o senador Mão Santa (PMDB-PI) chegou a afirmar que Meirelles parecia um "Deus Sol", diante de sua importância no governo. Ele traçou um paralelo com a Corte de Luís XIV - conhecido como o "Rei Sol" - na qual um assessor tornou-se tão poderoso que teria passado a ser temido até pelo próprio monarca.

Segundo Márcio Cypriano, presidente do Bradesco, a crise das hipotecas de alto risco aconteceu em função do excesso de liquidez no mercado. Ele lembrou que os bancos no Brasil não possuem papéis lastreados em hipotecas. As perdas aqui, afirma, se devem à facilidade de negociação das ações para os estrangeiros. No Bradesco, cerca de 30% das ações preferenciais são de estrangeiros. Cypriano esteve ontem no Rio para a reunião da Apimec-Rio.

O dólar atingiu ontem seu quarto recorde seguido de baixa frente ao euro em Nova York, devido à queda da confiança do consumidor americano e de dados negativos sobre o mercado imobiliário, que aumentaram as expectativas de mais um corte de juros pelo Federal Reserve. A redução nos juros dos EUA tornaria os ativos americanos menos atraentes. O euro foi negociado a US$1,4154, nível histórico, e fechou a US$1,4144.

COLABOROU: Bruno Rosa